A arte de conversar com si mesmo

A arte de conversar com si mesmo

Existe uma onda contemporânea de falar sobre tudo, em qualquer lugar e com qualquer pessoa.

Todos são expertises em qualquer coisa.

Isso não é uma crítica, apenas uma reflexão. Ao passo que todos, nos sujeitos, temos o direito e a liberdade de emitir nossas opiniões e pensamentos. O que se perdeu foi a capacidade de ponderar em quais momentos, lugares ou com quem se faz positivo e produtivo colocarmos nossas opiniões. Opiniões alheias se perdem no vento, pois não há quem as escute ou as considere. Causa desgaste, causa polêmica e desconforto. E em nome do que? Será que realmente nossas opinião importa sempre? Será que somos tão importantes, achando que nossas ideias mudaram algo?

A arte de conversar com si mesmo


O fato é que muitos querem falar, mas poucos querem se aprofundar. Muitos querem expor e pouco querem refletir. Hoje em dia não há um pensar, avaliar antes de falar. A palavra se torna solta, mas não no sentido da liberdade / privação mas solta no seu próprio sentido.

Nossa palavra só vale quando se tem quem quer ouvir, nossa opinião só cabe quando há uma reflexão sobre as situações, nossas ideias são bem vindas para trazer soluções. Há uma direção da palavra que se perde quando todos querem só falar, e falar e falar…

É preciso se aprofundar as vezes, entender o que se fala, analisar se quem ouve pode ouvir e se o objetivo de sua fala contribui ou não com o que se propõe. Não damos pérolas aos porcos, tão pouco podemos dar o que não temos!

Nos comunicamos incansavelmente, seja no nosso ambiente profissional ou no nosso ambiente pessoal e, para cada ambiente, utilizamos maneiras diferentes para nos relacionar. O que percebemos que existe de comum em todos esses ambientes: São as pessoas!

É da natureza humana querer falar, sentir que está sendo compreendida e, principalmente, ter alguém que possa te escutar de forma genuína sem a pretensão de ganhar alguma coisa em troca. Só o fato de alguém querer saber sobre você e entender suas angústias/seus anseios sabemos que é acolhedor.

Vou te contar um segredo: o que muitas das vezes percebemos na prática, é que não compreendemos o que falamos, não compreendemos as pessoas, não nos compreendemos e isso dificulta demais as relações humanas como um todo! E ter consciência disso é libertador, pois temos a oportunidade de ressignificar o nosso ato de escuta!

A escritora e filósofa Delia Steinberg Guzmán cita em seu livro “A Arte de Triunfar na Vida” que:

“... para conversar há, sobretudo, que saber ouvir”

Para saber se comunicar, para saber conversar, para o processo de aprendizado, para saber trocar ideias com outras pessoas, há primeiro que aprender a saber ouvir. Essa é uma necessidade muito antiga do ser humano e sabemos que um dos grandes atritos nas relações atualmente é o processo da comunicação. Muitas vezes as ideias são trocadas, as opiniões são ditas, mas como nenhum e nem o outro estão realmente prestando atenção no significado profundo das palavras daquele que está a sua frente, muitas vezes as incompreensões acabam surgindo daí. 

Voltando a fala da Guzmán, ela ainda cita...

“... saber ouvir é saber raciocinar no ritmo do outro – entrar no movimento da sua mente e do seu coração. Isto significa o domínio de si mesmo, respeitando a capacidade de convivência entre os seres humanos...”

Essa capacidade de ouvir ao outro, ainda que ele pense diferente de nós, permite que a gente vá calibrando aquilo que nós pensamos, calibrando o valor das nossas palavras, calibrando o valor do que nós pensamos, dos nossos próprios sentimentos e, ao mesmo tempo, tendo a oportunidade de se aproximar de uma maneira mais profunda daquilo que o outro está pensando ou sentindo, ou por que ele está colocando determinada questão de uma determinada maneira, o que será que isso significa?!

A escuta precisar ser atenta, participativa com olhar, com gestos corporais, utilizando grande parte dos nossos canais sensoriais. Usar os canais sensoriais no diálogo traduz que estaremos totalmente presente, pois estaremos visualizando todo o contexto: a expressão do rosto da pessoa, ouvindo o tom da voz e, muitas vezes, colhendo a percepção do que realmente está por detrás de uma simples pergunta. Estamos "escutando" o não verbal! Fazendo com que o outro se sinta confortável e acolhido!

De forma que o outro perceba que ele pode ter calma, que o ouvinte está disposto a escutar, está prestando atenção ao que ele está dizendo e que ele está sendo profundamente considerado pelo ouvinte. Esse ato de escutar possibilita uma melhor comunicação, troca de ideias e entendimento. E não estou falando aqui em concordar com tudo que o outro está dizendo e, sim, de uma compreensão profunda muito além daquilo que aparentemente nos separam que é a diferença de ideias, de pensamentos e de sentimentos.

E você sabia que poucos de nós já tiveram algum treinamento sobre como escutar de forma eficaz?

Rubem Alves, em seu texto chamado "A Escutatória", trouxe uma reflexão: "Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular. Escutar é complicado e sutil…"

E ainda parafraseando o Alberto Caeiro refletiu: “Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma”. Daí a dificuldade: a gente não aguenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer…

" ... nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos…"

Você já desacelerou em alguns momentos para compreender como está sua habilidade de escuta ou como pode melhorar?

Como está seu hábito de escuta?

Com novas informações e praticando algumas estratégias, certamente é possível melhorar sua habilidade de escuta. Você vai aproveitar melhor essa leitura se você realmente acreditar que pode escutar melhor, que é um comportamento aprendido e melhorado. E não um dom de nascença que temos ou não! 

Mas como eu faço isso?

Na habilidade de escuta existem 05 grandes áreas de atenção para uma escuta eficaz. Não é possível se concentrar em todas ao mesmo tempo, da mesma forma que, não necessariamente, as 05 farão sentido dentro do mesmo cenário.

  • Memorização de Detalhes: é a capacidade de ouvir e guardar informações.
  • Compreensão do Quadro Geral: significa que você consegue compreender o significado geral de algo, mesmo que não se lembre dos detalhes. Você sabe das ideias principais do que está ouvindo e sintetiza as principais ideias fazendo uma análise sucinta! Porém se você se perde nos detalhes e não enxerga o todo provavelmente esse não é seu forte.
  • Avaliação do Conteúdo: ao ouvir uma pessoa você consegue formar uma opinião após coletar informações? Decidir entre duas possibilidades? Avaliar os pontos fortes e fracos de uma proposta? No entanto, se tudo que o outro diz sua voz critica e começa a questionar o que está ouvindo, ou você se distraia com o modo de falar da pessoa ou fatores externos, essa não é a sua área de escuta bem desenvolvida.
  • Atenção à Pistas Sutis: Ouvir não é apenas um processo auditivo. Boa parte do significado de uma mensagem vem das pistas não verbais dadas pelo falante. Expressão facial, linguagem corporal, tom de voz. Você é bom para perceber e interpretar os sinais não verbais que transmitem significado? Se for, esse é um comportamento que você executa com excelência.
  • Empatia com o Falante: certas situações exigem uma compreensão profunda do estado emocional do falante. A empatia é um dos pontos fortes, se você for uma pessoa que tem facilidade para identificar quando alguém está chateado, irritado, confuso, feliz e assim por diante. Quem ouve com empatia se entrega à experiência auditiva para entender melhor as emoções e sentimentos do falante. Se você saiu da conversa sem perceber as emoções, essa não é a sua melhor habilidade de escuta.

No cenário atual a habilidade da escuta com empatia nunca foi tão valorizada. Muito porque é um tipo de escuta capaz de construir confiança e respeito entre as partes. A escuta com empatia é importante para lidar com situações de conflito entre os membros de uma equipe, ou para ouvir um colega angustiado.

Pense além do círculo de colegas de profissão e vá até aos clientes. Se escutar com empatia, se demonstrar compreensão em uma situação difícil você pode dissipar emoções ou até acalmar um cliente decepcionado.

Identifique quando é necessário e coloque as suas habilidades em ação se quiser ser um comunicador melhor! 

“... aquele que só escuta a si mesmo, o que só aprecia suas próprias ideias e se sente traído pelo som de sua própria voz, o que não dá importância à existência de outras pessoas e as usa apenas como tela para refletir suas palavras, jamais poderá conversar, nem iniciar uma relação humana saudável.” 

Te convido após essa leitura uma reflexão: para que possamos nos compreender como seres humanos e efetivamente fazer um mundo novo melhor a partir de uma boa convivência humana!

Referências de leitura que podem te ajudar:

A Arte de Triunfar na Vida - Delia Steinberg Guzmán

O Palhaço e o Psicanalista: como escutar os outros pode transformar vidas - Christian Dunker

Os 07 Hábitos de Pessoas Altamente Eficazes - Stephen Covey

Você Sabe Ouvir? - Tania Castelliano