Como se estabeleceram as relações entre governo e classe trabalhadora?

Qualquer conceito pensado pelo historiador ganha um solo único: o tempo. Refletir numa perspectiva histórica remete imediatamente a um cuidado com a duração. Quando pensei sobre o que escrever, me lembrei de minhas aulas de Introdução dos Estudos Históricos com o Professor Caio Boschi na UFMG. Minha geração aprendeu a perguntar ao passado a partir de questões postas pelo presente. Diante do atual cenário de desmonte da legislação trabalhista brasileira e da Previdência Social, ambas construídas nos tempos de Vargas e, sobretudo, após a aprovação pelo Congresso nacional, em 22 de março de 2017, da lei de terceirização, me vi na “obrigação” --- como historiadora do Brasil republicano --- de escrever sobre um conceito que talvez aqui no Brasil tenha sido jogado, finalmente, na lata de lixo da História: o trabalhismo. O que é o trabalhismo? E no Brasil, o que podemos dizer da experiência trabalhista?

A leitura da Formação da Classe Operária Inglesa, de E. P. Thompson, e outros textos da História Social britânica (historiadores da New Left Review),  formaram meu entendimento de como os trabalhadores ingleses durante a Revolução Industrial foram se descobrindo enquanto classe e, na experiência coletiva, identificaram-se enquanto sujeitos explorados que não participavam da política, não possuíam assento no Parlamento e, portanto, não podiam reivindicar seus direitos, transformá-los em leis e galgar melhores condições de vida e trabalho.

O primeiro impulso, resistência, ao contato com o capitalismo foi uma quebradeira! Será que eles eram chamados de vândalos como a mass media chama os professores que vão para a ALERJ protestar em 2017? Hoje, há quem se espante quando black blocks destroem vitrines de concessionárias de automóveis e de bancos, por exemplo. Naquela época, os trabalhadores ingleses quebraram máquinas. Logo viram que o problema não eram as máquinas e sim, seus donos e a falta de participação política. O Ludismo foi duramente reprimido e os trabalhadores, não tendo para onde ir, tiveram que voltar para as fábricas e reconstruir as máquinas, ameaçados de perder a própria vida. Reunindo-se em bosques e cemitérios na calada da noite, foram se organizando. Logo nasceriam os primeiros sindicatos, embriões do futuro partido. Aprenderam com suas derrotas que o caminho era o sufrágio universal. O Cartismo foi, sem dúvida, um importante momento na construção da ideologia trabalhista. Era preciso votar e ser votado. Os trabalhadores deveriam ser eleitos e lutar por leis que transformassem o cotidiano dos operários. O Labor Party foi fundado em 27 de fevereiro de 1900 representando vertente política surgida a partir de certas questões relacionadas à defesa de interesses políticos e econômicos levantadas por alguns setores do movimento operário e sua história está diretamente relacionada ao incremento de legislação que garantisse equilíbrio na relação Capital-Trabalho, alternando distanciamento e aproximação com as políticas liberais adotadas pelo governo britânico ao longo do século XX.

No caso brasileiro, o Trabalhismo, antes de se consolidar enquanto projeto político- partidário, quando da fundação do PTB, em 1945, surgiu da relação que o governo Vargas estabeleceu com os trabalhadores a partir de sua chegada ao poder em 1930.  Em um dos livros clássicos sobre o tema, A invenção do Trabalhismo, de Angela de Castro Gomes, vemos com clareza a incorporação dos trabalhadores no jogo político a partir da apropriação da “voz operária”  pelo governo Vargas e sua transformação em discurso do Estado. A classe operária lutava por redução da jornada de trabalho, férias, descanso remunerado, salários dignos e outras bandeiras que podemos sacar dos jornais onde estavam grafados os desejos de cidadania de anarquistas, socialistas e comunistas que, permaneceram ao longo do tempo do liberalismo excludente da Primeira República, sem conseguir que suas reivindicações sequer fossem ouvidas. Sem falar da forte repressão sofrida, já que a luta operária e suas manifestações eram consideradas “caso de polícia”.

Entre 1930 e 1945, a Era Vargas empreendeu um programa de valorização do trabalho e do trabalhador, que envolveu a criação de instituições governamentais do porte do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, ainda em 1930, e da promulgação de um conjunto de leis trabalhistas e da Lei da Sindicalização, buscando a formulação de uma identidade social aos trabalhadores, controlada pelo Estado. No corporativismo, sindicatos estavam diretamente ligados ao Ministério e o Estado passava a regular as relações entre patrão e empregado. A ideologia do Homem Novo, trabalhador nacional, foi amplamente difundida pelo DIP e Vargas tornou-se um mito, verdadeiro “pai dos pobres”. Durante o Estado Novo, o pacto trabalhista foi reforçado e, após o fim da ditadura, aquilo que era chamado de varguismo e depois, melhor expresso no queremismo, acabou virando programa partidário: o trabalhismo do Partido Trabalhista Brasileiro. O PTB foi, até o golpe civil-militar de 1964, o locus aglutinador do trabalhismo no Brasil. A cidadania desejada na Primeira Republica, que havia sido conquistada e concedida na Era Vargas e fortalecida na “experiência democrática” entre 1946 e 1964, tornou a ser silenciada ao longo da ditadura militar até ressurgirem os movimentos sindicais e de trabalhadores a partir de fins do “milagre econômico”, com o chamado Novo Sindicalismo nascido nas grandes greves do ABC Paulista e de Contagem (MG). Mas esse sindicalismo não queria identificação com o trabalhismo. Também alguns sociólogos paulistas preocupados em encontrar um bode expiatório para o golpe, chamaram a experiência trabalhista entre 1930 e 1964 simplesmente de populismo.

E, finalmente, quando em 1994 Fernando Henrique Cardoso foi eleito presidente, discursou em sua posse que seria necessário destruir qualquer resquício da Era Vargas. O que isso significava era justamente o desmonte da legislação trabalhista, da estrutura sindical e, ainda uma profunda reforma da Previdência Social. Lula e Dilma conseguiram não precarizar as relações trabalhistas e chegaram a ampliar alguns direitos que ainda não tinham saído do papel, como os relativos aos empregados domésticos. Todavia, com o Impeachment da presidente, as primeiras ações do atual governo estão sendo justamente no sentido de retomar a política neoliberal de FHC: destruir a Era Vargas.

Em tempos como os que estamos vivendo, nada melhor do que voltarmos nosso olhar para a importância do estudo do trabalhismo lá e cá, esperando que aqueles trabalhadores nos sirvam de exemplo de resistência e ação política. Afinal, para que serve a História?

Para saber mais:

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil, um longo caminho. 4ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
GOMES, Angela de Castro. A invenção do trabalhismo. 2ª edição. Rio de Janeiro: Relume Dumará,1994. Primeira edição: 1988.
THOMPSON, E. P. A formação da classe operária inglesa. (3 vols.). Rio de Janeiro: Paz & Terra,1987.

*Andréa Casa Nova Maia é professora de História do Brasil Republicano e História da Arte no Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro – PPGHIS/UFRJ.

Como se estabeleceram as relações entre o governo e classe trabalhadora?

Compondo a maioria, os trabalhadores teriam suas atividades políticas e sindicais controladas pelas leis governamentais. Munidos de tal garantia, os representantes do empresariado se mostravam dispostos a arcar com os vários custos que a legislação trabalhista produziria ao longo do tempo.

Como se estabeleceram as relações entre governo e classe trabalhadora Brainly?

Criou a Justiça do Trabalho (1939), instituiu o salário mínimo, a Consolidação das Leis do Trabalho, também conhecida por CLT. Os direitos trabalhistas também foram fruto de seu governo: carteira profissional, semana de trabalho de 48 horas e as férias remuneradas.

Quais foram as reformas trabalhistas estabelecidas durante o governo?

Durante seu governo, Vargas criou a Previdência Pública (INSS), legalização dos sindicatos, estabelecimento da Carga Horária Racional, direito à greve, direito às férias e ao 13º salário. Vagas é conhecido como o presidente que deu início ao período Populista da história do Brasil.

Como o Estado conseguiu apoio e colaboração dos trabalhadores?

A Consolidação das Leis Trabalhistas ocorreu durante a ditadura de Getúlio Vargas, chamada de Estado Novo. Ele se aproximou dos trabalhadores e criou a imagem de “pai dos pobres” ao ser o líder político que concedeu os direitos trabalhistas aos trabalhadores brasileiros. |1| Texto da Constituição de 1937.