Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?
Antônio Fernando Costa Pella1
1 - Aluno do Mestrado em Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

Resumo

Este trabalho analisa as características do conteúdo tecnológico do comércio sino-brasileiro. A especialização brasileira em setores de produção de bens de baixo conteúdo tecnológico se intensifica no mesmo período em que o comércio entre Brasil e China cresce, ou seja, a partir dos anos 2000. Ao contrário do Brasil, o país oriental buscou uma política de desenvolvimento e de inovação capitaneada pelo Estado chinês. Consequentemente, o Brasil tem que ceder muito mais produtos para fazer frente às exportações chinesas para o Brasil. O resultado é uma grande lacuna nos termos de troca em favor da China.

Palavras-chave: Inovação; Conteúdo Tecnológico; Balança Comercial.

Abstract

This work analyzes the characteristics of the technological content in the export guidelines of the Sino-Brazilian trade. The Brazilian specialization in sectors of production of goods of low technological content intensified in the same period in which trade between Brazil and China grew, that is, from the 2000s. Unlike Brazil, the eastern country pursued a development policy and innovation led by the Chinese state. Consequently, Brazil has to cede much more products to face Chinese exports to Brazil. The result is a large gap in the terms of trade in favor of China.

Keywords: Innovation; Technological Content; Trade Balance.

CLASSIFICAÇÃO JEL: F10; F14.

1 - INTRODUÇÃO

O padrão de especialização da pauta exportadora brasileira é, historicamente, voltado para produtos de baixo valor agregado (NEGRI, 2005). Contudo, essa característica começou a se intensificar ainda mais a partir dos anos 2000. A indústria de média-alta tecnologia, como, por exemplo, a produção de químicos e veículos automotores, perdeu participação na pauta exportadora. Em 1999 ela representava 23% das exportações contra 17% em 2015, apesar do crescimento do valor exportado real de 111,33% no período. Já na indústria de alta tecnologia, que tem como carro-chefe a produção de aeronaves, a situação não foi diferente. Sua participação caiu quase a metade, de 8% para 5%, mesmo havendo um crescimento absoluto no mesmo período de 70,98% (MDIC, 2016).

Na contramão desse processo, os produtos não classificados na indústria de transformação responderam por 36% do total das exportações em 2015, contra 18% em 1999. Em termos absolutos, a preços constantes de dezembro de 2015, as exportações desse setor saltaram de US$ 11,8 bilhões para US$ 68,2 bilhões no mesmo período observado, obtendo um crescimento real de 576,26%. O quantum exportado cresceu 159,17% no mesmo período (MDIC, 2016).

Em termos gerais, é possível destacar três áreas responsáveis por esse incremento: agricultura e pecuária, extração de minerais metálicos e extração de petróleo e gás natural, que apresentaram crescimento real, entre 2000 e 2015, de 511,14%, 281,11% e 5.365,33%, respectivamente. A participação dos três na exportação de produtos não classificados na indústria de transformação alcançou 93,48% em 2015, um crescimento de 8,95% em relação a 1999, o que corresponde a 33,65% do fluxo total das exportações brasileiras em 2015 (MDIC, 2016).

Pelo lado das importações, a característica da pauta importadora brasileira sofreu pouca ou nenhuma modificação ao longo do período de 1999 a 2015, no que diz respeito à participação das indústrias classificadas por intensidade tecnológica. Se por um lado os produtos não classificados da indústria de transformação são os principais produtos exportados, nas importações eles são apenas o terceiro, indo de 11% em 1999 para 12% em 2015. O mesmo ocorre para a indústria de baixa tecnologia, como produtos alimentícios e têxteis, que mantiveram sua participação constante entre 1999 e 2015, em 10%, fazendo com que esses sejam os produtos com menor participação entre os importados pelo Brasil (MDIC, 2016).

Em 1999, a indústria de média-alta tecnologia detinha 43% do total importado, o mesmo percentual do ano de 2015 (Secex/MDIC, 2016). O quantum de importação cresceu 123,25% entre 1999 e 2015 (IPEADATA, 2016).

A partir da primeira década dos anos 2000, a participação da China nas exportações brasileiras cresceu a ponto de se tornar o principal parceiro comercial do Brasil. Essa relação comercial passou a ser configurada de tal forma que fez com que o Brasil se especializasse em fornecer produtos intensivos em recursos naturais, nos quais revela vantagens comparativas como a soja e o minério de ferro (CUNHA; BICHARA, 2011).

No ano de 2009, a China tornou-se o principal parceiro comercial do Brasil, papel antes ocupado pelos Estados Unidos da América (EUA). Em 2000, a China foi destino de apenas 1,97% das exportações brasileiras. Porém, influenciada pelo aumento da demanda chinesa por commodities, a participação chinesa alcançou 18,63% em 2015. Nesse ano, os dois principais produtos exportados para o país asiático foram, de acordo com o Sistema Harmonizado a seis dígitos, “soja, mesmo triturada, exceto para semeadura” e “minério de ferro não aglomerados e seus concentrados” que representaram, juntos, cerca de 60% do total (MDIC, 2016). De acordo com Soares e Castilho (2014, p. 2), “trata-se de uma concentração bastante superior à observada nas exportações brasileiras para o resto do mundo”.

A participação chinesa nas importações brasileiras saltou de 2,19% em 2000 para 17,92% em 2015, enquanto as importações brasileiras tiveram um crescimento real, a preços constantes de 2015, de 125,83% no mesmo período observado, concentrando, principalmente, na indústria de alta e média-alta tecnologia. Por outro lado, a participação brasileira nas exportações chinesas caiu no período de 2000 a 2014, de 26,55% para 10,21%, o que indica um crescimento muito elevado das exportações chinesas que de fato ocorreu, pois, de 1999 a 2014, as exportações globais chinesas tiveram um crescimento real de cerca de 860% (UNCTAD, 2016).

Observar o comportamento da relação comercial entre o Brasil e a China permite aprender as alterações na configuração da pauta exportadora brasileira, e, também, entender o caminho percorrido pela China para se tornar a grande indutora da demanda por commodities. Além disso, analisar o conteúdo tecnológico dessa relação nos permite constatar a trajetória percorrida por ambos os países no que se refere à competitividade internacional.

O país asiático possui uma posição de destaque no fluxo do comércio internacional, e qualquer análise da economia brasileira torna-se displicente se não levar em conta também a importância da economia chinesa e os impactos que ela causa internamente. É significativo também entender o porquê de o Brasil importar da China produtos de maior valor agregado, e não os produzir internamente, o que levaria ao país ter uma inserção internacional mais competitiva e dinâmica.

Com isso, a relevância do tema fica evidente por abranger uma questão recente e, ao mesmo tempo, tão antiga no cenário brasileiro. Dada essa problemática, esse estudo discute o conteúdo tecnológico das relações comerciais entre Brasil e China coma finalidade de entender os impactos gerados nos sistemas de produção internos e os efeitos para a competitividade brasileira no exterior.

2 - EVOLUÇÃO DAS RELAÇÕES COMERCIAIS ENTRE BRASIL E CHINA

O estabelecimento de relações diplomáticas entre Brasil e China data o ano de 1974. Curiosamente, nesse período, ambos passavam por mudanças em seus cenários políticos e sociais. O Brasil atravessava um período de ditadura militar enquanto a China vivia o radicalismo das reformas socialistas. Contudo, como observa Oliveira (2010, p. 88), “desde o início a parceria sino-brasileira apresentava o objetivo de uma ação conjunta em tópicos de interesses comuns de desenvolvimento na agenda internacional, demonstrando similaridades em alguns princípios de política externa”. Ainda nessa época, contrariamente ao período mais recente, o Brasil apresentava um forte estágio de desenvolvimento econômico enquanto a China tentava recondicionar a economia de volta aos trilhos. De acordo com Oliveira (2010), a China foi o único país asiático com que o Brasil obteve relações significativas nesse período.

No campo econômico, a partir dos anos 1980, a condição de desenvolvimento dos dois países se reverteu, com a China passando por forte crescimento econômico sustentado pelas suas reformas e o Brasil atravessando um período conhecido como “Década Perdida”. Desde então, a China atravessa um período com altas taxas de crescimento do seu produto e, no período observado de 1978 a 2015, sempre cresceu muito acima da média de crescimento mundial e do crescimento brasileiro, com ressalva para o final dos anos 1970, como podemos verificar no Gráfico 1:

Gráfico 1 - Taxa de crescimento anual (1978-2015) (%).

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Fonte: World Bank, 2016. Elaboração própria.

Desde o final dos anos 1970, a China adotou uma estratégia de abertura econômica, e o país ressurgiu como uma potência global. Seu rápido crescimento econômico e processo intenso de internacionalização fizeram com que, em 2011, sua economia contribuísse com mais de 10% do comércio global, 10% do produto interno bruto (PIB) mundial medido em preços de mercado e 15% do PIB mundial medido em poder de paridade de compra (CUNHA; LÉLIS; BICHARA, 2012). Essa ascensão chinesa provocou uma grande alteração no fluxo de exportações e importações mundiais, impactando principalmente os países da América Latina, que eram em sua maioria exportadores de produtos primários. Esse aumento das importações chinesas teve importantes repercussões sobre as exportações brasileiras de produtos agrícolas e agroindustriais. Efetivamente, entre 1997 e 2009, as exportações de produtos de origem agrícola do Brasil para a China passaram de cerca de US$ 700 milhões para US$ 8,9 bilhões, um aumento significativo que impactou bastante na economia brasileira (MDIC, 2016).

O Brasil sofreu duas consequências com essa ascensão da economia chinesa: o estímulo aos setores que se beneficiam da demanda chinesa por recursos naturais, e a pressão competitiva na indústria. Enquanto a indústria de transformação teve um incremento em seu déficit externo entre 2008 e 2011, o setor primário obteve superávits expressivos (CUNHA; LÉLIS; BICHARA, 2012). Os países da América Latina se tornaram mais vinculados à economia chinesa, em função dos poucos canais de comércio, e isso inclui o Brasil, que, por sua vez, passou por um processo de especialização regressiva, e por meio dessa alteração no padrão brasileiro de comércio internacional, passou a depender mais ainda das exportações de recursos naturais, já que houve uma perda de capacidade de competir nos mercados local e global (CUNHA; LÉLIS; BICHARA, 2012).

O Brasil, em contraste com a China, não tem conseguido estabelecer uma estratégia nacional capaz de articular planejamentos, projetos e políticas de desenvolvimento no longo prazo. Pode-se argumentar que o Plano de Metas e os Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND) foram os que mais se aproximaram dessa ideia quanto à sua forma (MASIERO; COELHO, 2014). Em períodos recentes, pós anos 1990, o que ocorreu foram políticas isoladas, não totalmente articuladas, que tentaram resolver problemas específicos, principalmente fiscais, cambiais ou inflacionários, mas nunca de forma articulada com os agentes produtivos e com fraca capacidade de mobilização e liderança do Estado. Já a China tem conseguido uma grande expansão industrial e internacional como resultado de suas articulações de políticas setoriais, que permitiram modificações em processos internos de suas empresas, de gestão de tecnologias e produtos (MASIERO; COELHO, 2014).

As relações comerciais entre Brasil e China, apesar de já acorrer desde a década de 1970, começaram a se intensificar no início dos anos 2000. Em 1997, a China não figurava entre os 15 maiores parceiros comerciais do Brasil em termos de corrente de comércio. Já em 2009, a China assumiu a primeira posição que sempre foi ocupada pelos Estados Unidos, sendo que nesse ano a participação da China na corrente de comércio brasileira foi de 13,15% (MDIC, 2016). Do outro lado, em 2000, o Brasil ocupava a vigésima primeira posição no ranking de participação na corrente de comércio chinesa, com 0,5% do total, e em 2012 o país assumiu a oitava posição (CHINA CUSTOMS, 2016). A evolução das relações comercias entre os dois países pode ser entendida a partir do Gráfico 2:

Gráfico 2 – Posição do Brasil e da China na respectiva balança comercial.

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Fonte: Secex/MDIC e China Customs. Elaboração própria.

A mudança no ranking de principais parceiros comerciais dos dois países ocorreu com a entrada da China na OMC em 2001. De acordo com Bekerman et al (2013, p. 11), “ao ingressar na OMC, no fim de 2001, a China teve que adaptar sua estrutura tarifária, por meio da redução de tarifas e eliminação de barreiras não tarifárias, entre outras”, e, a partir desse novo contexto, a China se permitiu abrir novos mercados para suas exportações e importações, além de ter acesso a fontes de abastecimento de insumos e matérias-primas (BEKERMAN et al, 2013). Também para Medeiros e Cintra (2015, p. 34):

As relações comerciais entre a China e países da AL começaram a se intensificar a partir de 2002, com o ingresso da China na OMC e pela maior ofensiva comercial a partir da visita de Hu Jintao em 2004, quando dezenas de acordos comerciais, de investimentos e de cooperação foram assinados com diversos países da região.

Além disso, segundo Medeiros e Cintra (2015), o aumento da demanda chinesa por commodities provocou aumento nos preços desses bens.

A elevação do preço das commodities permitiu um crescimento generalizado das exportações tanto dirigido diretamente para a China — contribuindo em muitas delas para um saldo comercial elevado — quanto para o resto do mundo; por outro lado, no caso das economias mais diversificadas (Argentina e Brasil) o maior crescimento dos países primário especializados permitiu aumentar as exportações não apenas de commodities mas a de bens industriais (ainda que a taxas menores) para estes mercados, gerando inclusive superávit comercial com os países da América do Sul (MEDEIROS; CINTRA, 2015, p. 38).

Para cristalizar o entendimento dessa motivação, além de ambos assumirem posições de maior importância, com destaque para a China, que, em 2009, se tornou o principal parceiro comercial do Brasil superando dois outros antigos parceiros brasileiros, os Estados Unidos e a Argentina, os valores e o volume exportado cresceram de forma vertiginosa nos anos que sucederam a entrada da China nas negociações da OMC:

Gráfico 3 – Balança comercial do Brasil com a China (milhões de US$).

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Fonte: Secex/MDIC. Valores deflacionados pelo Consumer Price Index. Elaboração própria.

Nos últimos anos, o saldo da balança comercial tem pesado mais para o lado do Brasil do que da China, e a importância que China tem para a economia brasileira é refletida no fato de que, por exemplo, em 2011, ápice do montante da diferença entre exportações e importações, o saldo representou 38,68% do saldo total (MDIC, 2016). Dentro desse contexto, os principais produtos exportados pelo Brasil para a China no último ano foram soja mesmo triturada, exceto para semeadura, minérios de ferro não aglomerados e seus concentrados, óleos brutos de petróleo. Enquanto a China exportou para o Brasil, principalmente, partes de aparelho para telefonia, partes de aparelhos radiofônicos e terminais portáteis de telefonia celular (MDIC, 2016). Em 2004, o conteúdo da pauta exportadora dos dois países não era muito diferente, sendo que nesse período os principais produtos exportados do Brasil para a China foram outros grãos de soja mesmo triturados, minérios de ferro não aglomerados e seus concentrados e óleo de soja, em bruto, mesmo degomado. Em contrapartida, os principais produtos exportados pela China para o Brasil no ano de 2004 foram coques de hulha, partes de aparelhos transmissores e/ou receptores e dispositivos de cristais líquidos (LCD) (MDIC, 2016).

Em relação à diversificação dos produtos dos dois países, o Brasil tem uma pauta exportadora mais concentrada do que a pauta chinesa, e essa concentração aumentou no período de 2004 a 2015, como podemos observar nas tabelas abaixo, que mostram os principais produtos exportados e importados do Brasil em relação à China:

Tabela 1 – Principais produtos Exportados e Importados para/da China em 2004.

Produtos exportados para a China % Produtos importados da China %
Outros grãos de soja, mesmo triturados 29,81 Coques de hulha, de linhita ou de turfa. 9,13
Minérios de ferro não aglomerados e seus concentrados. 14,36 Outras partes p/aparelhos transmissores/receptores. 4,37
Óleo de soja, em bruto, mesmo degomado. 7,77 Dispositivos de cristais líquidos (lcd). 4,29
Minérios de ferro aglomerados e seus concentrados. 6,13 Outras partes p/aparelhos receptores Radio, Televisão, etc. 2,67
Pasta quim.madeira de n/conif.a soda/sulfato, semi/branq 4,64 Tecido de filam.poliester textur, tintos, s/borracha 1,85
OUTROS 37,29 OUTROS 77,69

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

Tabela 2 – Principais produtos Exportados e Importados para/da China em 2015.

Produtos exportados para a China % Produtos importados da China %
Soja, mesmo triturada, exceto para semeadura. 44,34 Outs.parts.p/apars.d/telefonia/telegrafia. 4,10
Minérios de ferro não aglomerados e seus concentrados 16,15 Outs.partes p/aparelhos recept.radiodif.televisao, etc. 3,86
Óleos brutos de petróleo. 11,62 Barcos-farois/quindastes/docas/diques flutuantes, etc. 3,09
Pasta quim. Madeira de n/conif. 4,62 Terminais portáteis de telefonia celular. 1,21
Outros açúcares de cana. 2,12 Litorinas (automotoras) de fonte ext.de eletricidade 1,17
OUTROS 21,15 OUTROS 86,5

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

A partir das tabelas 1 e 2 podemos perceber que o Brasil, que já possuía uma pauta exportadora pouco diversificada dos seus produtos vendidos para a China, intensificou ainda mais essa característica nos últimos anos enquanto a China manteve a sua pulverizada. Em 2004, os cinco produtos mais exportados para o país asiático representaram 62% do total enquanto que em 2015 os cinco produtos mais exportados representaram quase 80% do total (MDIC, 2016).

Para Cunha et al (2012), há uma intensificação do comércio bilateral Brasil-China e que essa relação tende a posicionar a economia brasileira como especializada no fornecimento de commodities. Os autores acreditam que a ascensão chinesa vem afetando, cada vez mais, o desempenho das economias latino-americanas, em especial, a economia brasileira. A demanda chinesa por produtos agrícolas, minerais e energia resultou, por um lado, em superávits de comércio para países ricos em recursos naturais, o que contribuiu para um virtuoso ciclo de crescimento com menores vulnerabilidades externas e fiscais. Nos últimos anos, como demonstra Masiero e Coelho (2014), vem caindo a participação dos produtos primários na pauta exportadora chinesa enquanto que esse processo é inverso no Brasil, com o país se especializando cada vez mais em produtos de baixa intensidade tecnológica para alimentar o mercado mundial e, em especial, o mercado chinês.

O crescimento chinês, como pudemos perceber, foi fruto de uma política de Estado. Os resultados alcançados fizeram com que a China, nos anos seguintes, pudesse galgar uma posição de destaque no comércio internacional. Ao passar a atrair capitais e ser um grande exportador de manufaturas, que possuem um maior valor agregado, o país oriental pôde também trabalhar fazendo o caminho inverso: ser investidor direto em vários países, inclusive no Brasil.

O resultado da parceria sino-brasileira iniciada na década de 1970, só começou a ser significativa a partir dos anos 2000, com a entrada da China na OMC. A partir disso, a demanda chinesa por commodities fez os preços desses bens deslanchar e, consequentemente, o comércio entre Brasil e China.

3 - ANÁLISE DO CONTEÚDO TECNOLÓGICO DAS RELAÇÕES COMERCIAS ENTRE BRASIL E CHINA

3.1 Conteúdo Tecnológico da Balança Comercial Brasileira

Estudos empíricos sobre o comércio exterior têm destacado a importância crescente dos produtos mais intensivos em tecnologia para a corrente de comércio mundial nos últimos anos (NEGRI, 2005). “Dos 15 produtos que mais contribuíram para o crescimento das exportações mundiais na década de 90, 14 deles eram produtos classificados pela UNCTAD como de alta ou média intensidade tecnológica” (COUTINHO et al, 2003, apud NEGRI, 2005, p. 6). Apesar disso, de acordo com Negri (2005), estudos também analisaram o conteúdo do comércio exterior brasileiro e “grande parte deles ressalta o quanto o país é deficitário em produtos de alta intensidade tecnológica e como a pauta de exportações brasileira não parece estar se encaminhando para uma maior participação desses produtos” (NEGRI, 2005, p. 7). Esse fato também foi visualizado por Hermida e Xavier (2012), que afirmam que o padrão do comércio internacional está caminhando no sentido de bens com maior intensidade tecnológica enquanto as exportações brasileiras se afastam dessa tendência.

Com base na classificação da UNCTAD dos bens relacionados no sistema harmonizado e nos dados fornecidos pelo Ministério da Indústria e Comércio Exterior (MDIC) brasileiro, é possível identificar um aumento significativo da importância dos produtos não classificados na indústria de transformação na pauta exportadora brasileira, ou seja, aqueles produtos que praticamente não sofrem alterações em seus estados naturais no processo de produção. Em 1997, a participação desse tipo de bem no comércio internacional brasileiro foi de 19% do total exportado naquele ano. Em 2015, essa fatia aumentou para 36%, sendo que em 2010 essa proporção foi de 41% (MDIC, 2016).

Os sintomas dessa característica de uma economia voltada para a produção de bens primários, segundo Coutinho e Ferraz (1994, apud HERMIDA; XAVIER, 2012).

Esforços no sentido de realizar reformas comerciais não foram acompanhados por políticas industriais e tecnológicas capazes de alterar a situação competitiva da indústria brasileira, o que tornou a base produtiva brasileira ainda mais concentrada em setores de menor intensidade tecnológica (HERMIDA; XAVIER, 2012, p. 337).

Gráfico 4 - Evolução das participações nas exportações brasileiras por conteúdo tecnológico (1997-2015) (%).

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Fonte: Secex/MDIC. Visitado em maio/2016. Elaboração própria.

No caso brasileiro, em se tratando da balança comercial de produtos com maior conteúdo tecnológico, no período entre 1997 a 2015, a importação de produtos da indústria de transformação classificados como alta tecnologia ou média-alta tecnologia tiveram uma participação de cerca de 60% ao longo do período, enquanto que os produtos não classificados na indústria de transformação e os de baixa tecnologia tiveram uma participação de cerca de 24% (MDIC, 2016). No período de janeiro a outubro de 2016, por exemplo, nove dos dez produtos mais importados pelo Brasil são classificados como alta ou média-alta tecnologia. Pelo conceito de fator agregado, que separa os bens em básicos, semimanufaturados e manufaturados, conforme o grau de transformação que eles sofrem no processo produtivo, sendo que, quanto mais tecnológico o produto, maior valor agregado ele tem (Secex/MDIC, 2016). As participações das três divisões nas importações brasileiras ao longo do período observado de 1997 a 2015 se comportaram conforme o gráfico abaixo:

Gráfico 5 –Importações brasileiras por fator agregado de 1997 a 2015 (%).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

As importações brasileiras, conforme o gráfico acima, se concentram predominantemente em produtos manufaturados, com maior valor agregado, como turbinas de aeronaves importadas dos Estados Unidos e placas de circuito impresso importadas da China. Ao longo de todo o período observado, a participação desse tipo de bem não ficou abaixo de 75%, sendo que no ano de 2015 essa divisão ficou acima de 84% (MDIC, 2016).

Em relação às exportações, como explicitado anteriormente, a literatura nos apresenta que o Brasil se especializou na produção de bens com baixo valor agregado, como a soja e o minério de ferro. Esses produtos, pelo conceito de fator agregado, são classificados como básicos, pois são vendidos praticamente pela forma que são encontrados na natureza. Retrocedendo o período analisado de 1997 para 1985 até 2015, é possível perceber que de 1985 até o fim dos anos 1990, a participação de produtos básicos nas exportações brasileiras vinha perdendo força pois, no início do período observado, eles representavam 33,30% do total exportado em 1985 (MDIC, 2016). Já no ano de 2000, a participação ficou em 22,80% do total exportado naquele ano. Contudo, na primeira década dos anos 2000, esse quadro começou a se inverter, e em 2015, a participação ficou em cerca de 46% (MDIC, 2016), como podemos observar no gráfico, com dados do MDIC:

Gráfico 6 –Exportações brasileiras por fator agregado de 1985 a 2015 (%).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

O impacto dessa especialização brasileira pode ser verificado de duas formas: o saldo da balança comercial dividido pela classificação por nível de agregação de valor ou por intensidade tecnológica.

Gráfico 7 – Saldo da balança comercial brasileira por fator agregado de 1997 a 2015 (US$).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

Gráfico 8 – Saldo da balança comercial brasileira por intensidade tecnológica de 1997 a 2015 (US$).

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Fonte: Secex/MDIC com metodologia UNCTAD. Valores deflacionados pelo CPI. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

As informações apresentadas nos gráficos 7 e 8 elucidam a composição e a lógica das relações comerciais do Brasil com o resto do mundo. Primeiramente, a partir do começo dos anos 2000, a importância dos bens primários ou dos produtos não classificados na indústria de transformação para a balança comercial brasileira torna-se evidente pois, se analisarmos o período de 2009 a 2014, no gráfico 8, o país teve déficits nas três maiores classificações de intensidade tecnológica e mesmo assim obteve superávits totais na balança comercial sustentados pelos produtos e baixo valor agregado. Além disso, em todo o período observado, o Brasil sempre foi deficitário na balança de bens de alta e média-alta tecnologia. De acordo com Negri (2005), a falta de políticas de inovação no país fez com que houvesse uma dependência brasileira de produtos de maior intensidade tecnológica. Caberia ao país, assim,

Estimular o esforço inovador das empresas, e não apenas esforços de inovação destinados à adaptação de produtos ao mercado doméstico, como parece ser o padrão dessas firmas. Esse estímulo poderia possibilitar, inclusive, a internalização, no país, da produção de peças e componentes atualmente importados, suavizando a dependência brasileira da importação de produtos intensivos em tecnologia (NEGRI, 2005, p.18).

3.2 Intensidade Tecnológica das Relações Comerciais Sino-Brasileiras

Nos dados apresentados sobre a evolução do comércio entre Brasil e China, foi explicitado que o crescimento vertiginoso das relações entre os países começou no início dos anos 2000 por conta do ingresso da China nas mesas de negociação da OMC e pela constante necessidade do país oriental em suprir a demanda interna de sua grande população por commodities e insumos para serem utilizados nos processos de produção, uma vez que a nova inserção internacional da China a posicionou como um grande exportador de manufaturados e/ou de bens industrializados.

Aliada a isso, a especialização do Brasil nessa mesma classe de produtos (HERMIDA; XAVIER, 2012) fez com que o comércio entre os dois decolasse. Em 1985, por exemplo, a composição das exportações do Brasil para a China, apesar de representar apenas 3,19% do total exportado pelo país naquele ano (UNCTAD, 2003), foi de 6% de produtos básicos, 30% de semimanufaturados e 64% de manufaturados (MDIC, 2016). A participação das exportações brasileiras no total mundial exportado foi de 1,3% (UNCTAD, 2003). Em 1995 a composição foi de 16% de básicos, 57% de semimanufaturados e 27% de manufaturados (MDIC, 2016). A participação brasileira no total das exportações mundiais foi de 0,9% (UNCTAD, 2003). Contudo, dez anos depois, em 2005, os bens básicos já representavam 68,38% do total exportado para a China e em 2015 a participação deles chegou em 80,29% (MDIC, 2016).

Interessante notar que desde os anos 1990 as importações brasileiras da China sempre foram muito concentradas em bens manufaturados, principalmente em artigos eletrônicos como partes de monitor LCD e placas de circuito impresso. No começo dos anos 2000, por exemplo, esse tipo de bem representou 90,43% do total importado da China, atingindo 97,15% em 2015 (MDIC, 2016). A participação chinesa nas importações brasileiras, que foi de 2,19% em 2000, atingiu 17,92% em 2015 (MDIC, 2016). Isso significa que, do total importado pelo Brasil no ano 2000 em bens industrializados 2,38% vieram da China, enquanto que, em 2015, 20,62% tiveram a mesma origem. Esse aspecto do comércio entre os dois países, bem como a evolução dessas características podem ser visualizados a partir gráfico:

Gráfico 9 – Evolução dos produtos básicos nas exportações brasileiras totais e para a China (%).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

O crescimento da participação dos produtos de baixo valor agregado nas exportações totais aumentou ao longo do início do século XXI, saindo de 28,8% em 2000 para 45,62% em 2015, influenciado pela demanda chinesa, que importou 5,89% do total em 2000 e subiu para 32,79% do total em 2015 (MDIC, 2016). Ou seja, de todos os bens primários exportados no ano de 2015, um terço foi para a China. Além desse fato, conforme apresentado anteriormente, a concentração da participação de produtos na pauta exportadora do Brasil para a China pode ser reduzida a poucos bens, como é possível visualizar na tabela 3. A soja e o minério de ferro, ao longo do período de 2004 a 2015, somados, sempre representam mais de 40% do total exportado à China, sendo que, desde 2009, sempre ficaram acima de 60% (MDIC, 2016). Importante apontar que dos dois produtos, pelo conceito de fator agregado, são classificados como básicos. Pela metodologia de classificação da UNCTAD, por intensidade tecnológica, tanto a soja quanto o minério de ferro, na forma em que são comercializados, não são classificados na indústria de transformação, pois, basicamente, o processo produção é de extração na natureza ou cultivo, e transporte ao destino final. Ainda de acordo com dados do MDIC na tabela 3, desde 2005 que ao menos os três principais produtos exportados à China são classificados como básicos.

Outra forma de visualizar a crescente relevância das commodities e/ou dos bens de baixo valor agregado para a balança comercial brasileira é desconsiderar o efeito da variação do nível de preços, deflacionando os valores trazendo-os para a mesma base. Contudo, uma apresentação mais simples da forma como a importância dos bens primários se comportou é analisar o crescimento real da produção. O índice do quantum exportado calcula essa variação ao longo do tempo (IPEADATA, 2016). O gráfico 10 abaixo apresenta o quantum exportado de bens básicos e das exportações totais de 1995 a 2015. A partir de 2001, o crescimento da quantidade dos bens básicos supera em praticamente todos os anos o crescimento da quantidade de toda a exportação brasileira, justamente no mesmo período do crescimento da corrente de comércio sino-brasileira. Entre 2000 e 2015 o quantum de bens básicos cresceu 265,5% enquanto que o quantum de exportações totais cresceu 109,25% (IPEADATA, 2016).

Gráfico 10 – Índice de quantum de exportação de bens básicos e totais (média 2006=100).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: Funcex. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

Se por um lado a intensificação das relações comerciais entre Brasil e China, de acordo com dados do MDIC, fez com que a importância dos produtos básicos aumentasse na balança comercial brasileira no século XXI, os bens manufaturados, pelo lado da China, se comportaram de maneira semelhante, sendo que ao longo do período de 2000 a 2015 a proporção desse tipo de bem nunca ficou abaixo de 83%, como demonstrado anteriormente.

Conforme ilustrado no gráfico 3, de 2009 a 2015 o Brasil possuiu superávit comercial com a relação com a China. O gráfico 11 desagrega a série histórica do saldo da balança desse período de modo a ressaltar a importância de cada categoria de bem para o respectivo país:

Gráfico 11 – Saldo da balança comercial brasileira com a China por fator agregado desconsiderando os semimanufaturados (US$).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: Secex/MDIC. Visitado em outubro/2016.Elaboração própria.

O resultado demonstrado pelo gráfico 11 resume a lógica da relação comercial sino-brasileira. Por um lado, o Brasil ao longo de todo o período sempre foi superavitário na balança de bens primários. A China, por sua vez, sempre foi superavitária na balança de manufaturados. Não seria exagero dizer que as duas balanças se anulam, o resultado em certos períodos tende mais para um e em outros períodos tende mais para outro. Por exemplo, no ano de 2013 o superávit na balança de bens básicos brasileira foi de US$38,1 bilhões enquanto que o déficit da balança de manufaturados foi de US$34,8 bilhões (MDIC, 2016).

A relevância do conteúdo tecnológico dessa relação começa a aparecer de forma mais explícita neste ponto da discussão. O esforço realizado pelos dois países para compor os saldos comerciais pode ser mensurado pela quantidade de bem que cada um abre mão em troca de haveres monetários. Quanto maior o valor agregado de um determinado produto, por mais haveres monetários ele será trocado. Na corrente de comércio sino-brasileira e em todas as demais, a forma de mensurar esse esforço é através dos termos de troca. O valor recebido pelo Brasil por cada quilo de produto que ele vende à China e o valor que ele paga por cada quilo de produto pode ser visualizado no gráfico seguinte:

Gráfico 12 – Termos de troca Brasil x China (2004-2015) (US$/KG).

Por que o Brasil é um grande exportador para a China?

Fonte: IPEADATA. Visitado em novembro/2016. Elaboração própria.

Por essa ótica é possível ressaltar a relevância do conteúdo tecnológico para a agregação de valor nas relações internacionais. A comercialização de bens de baixo valor agregado, conforme o gráfico 12, faz com que o Brasil precise fazer frente aos saldos comerciais vendendo muito mais quantidade para compensar um eventual déficit. Enquanto no ano de 2015 o Brasil vendeu os seus produtos para a China por, em média, US$0,14/Kg, pelo mesmo peso, precisou desembolsar, em média, US$2,81. Isso significa que o peso das mercadorias vendidas da China para o Brasil custa 20 vezes o peso das mercadorias que o Brasil vende para a China.

A diferença na capacidade dos dois países em agregar valor aos seus bens depende do processo de inovação que cada um planejou e implementou. Para Nonnenberg (2013, p. 122), “o processo de inovação possibilita aos países avançar na escala tecnológica, passando a produzir cada vez mais produtos manufaturados intensivos em tecnologia”. Porém, esse processo de inovação aconteceu de maneiras diferentes no Brasil e na China. Enquanto o primeiro manteve inalterada a sua participação nas exportações mundiais de manufaturas, com 0,7% entre 2000 a 2011, o país oriental elevou sua participação de 4,3% para 10,4% (PEREIRA, 2014, p. 8). “No caso brasileiro, foi o aumento da participação do país nas exportações agrícolas mundiais de 2,8% para 5,2% que explica o resultado geral. A pauta de exportações brasileiras se ‘primarizou’” (PEREIRA, 2014, p. 9). De acordo com Pereira (2014), o efeito China sobre o comércio exterior brasileiro nos anos 2000 pode ser investigado através de dois argumentos: o primeiro é que essa primarização está associada ao aumento da demanda chinesa por commodities e pelas vantagens comparativas do país oriental na produção de manufaturas.

Outra linha de argumento identifica a questão da primarização da pauta de exportações com desindustrialização. Nesse caso, o desalinhamento cambial associado a uma política de desvalorização cambial administrada pela China leva a uma concorrência desleal, razão para a perda de participação das manufaturas brasileiras no mercado mundial (PEREIRA, 2014, p. 9).

Para Araújo (2013), a China passa por uma mudança estrutural nos seus indicadores de inovação, enquanto o Brasil não consegue aproveitar o seu crescimento no campo científico em inovação. O autor apresenta uma síntese comparativa dos indicadores de inovação dos dois países:

Tabela 3 – Indicadores básicos de CT&I referente ao ano de 2008.

Indicadores de CT&I China Brasil
P&D total (% PIB) 1,53 1,09
P&D empresarial (% PIB) 1,13 0,51
Patentes triádicas\(\ast\) (milhões de habitantes) 0,39 0,34
Artigos científicos (milhões de habitantes) 156,25 141,39
Firmas com inovações no mercado (% de todas as firmas) 14,87 3,62
Pesquisadores (a cada mil empregados) 2,03 1,46
Diplomas em ciência e engenharia (% de todos os novos diplomas superiores) 36 10,96
População entre 25-64 anos com diploma superior (%) 10,49 11,94
P&D empresarial (% P&D total) 73,87 46,43

Fonte: OECD Science, Technology and Industry Outlook DE 2010. Retirado do artigo de Araújo (2013).
\(\ast\)Patentes registradas nos três principais escritórios de patentes do mundo: dos Estados Unidos, da União Europeia e do Japão.

Em 1991, a percentagem do PIB chinês com gastos em P&D era de 0,74%, saltando para 1,53% em 2008. Apesar de não figurar entre as taxas mais altas do mundo, o seu gasto total com inovação foi o terceiro maior do mundo, somente atrás da União Europeia e dos Estados Unidos (ARAÚJO, 2013).

Além do valor crescente dos gastos em P&D propriamente ditos, também merece atenção a mudança em sua composição: em 1987, 60,3% da P&D foi conduzida em instituições públicas de pesquisa (IPPs) e apenas 29,7% em empresas; em 2004, estes valores foram, respectivamente, 22% e 66,8% (OECD, 2008, apud ARAUJO, 2013, p. 9).

4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diferentemente do Brasil, a China, desde a década de 1970, teve uma política voltada para o desenvolvimento industrial e inovação. Essas políticas, como pudemos ver, fizeram com que o país asiático desse um salto de qualidade na produção de seus bens tanto para o mercado interno quanto para o mercado externo. Além disso, se tornou um grande país manufatureiro, chamado de “fábrica do mundo”, e, com isso, demandando grandes quantidades de insumos e matéria-prima para a sua produção.

No campo de sua especialidade, o Brasil é extremamente competitivo, e o país com uma maior abundância relativa de um fator se especializa na produção do bem que utilizada mais intensamente um fator relativamente ao outro. Nesse caso, o Brasil possui recursos naturais em abundância, e se especializou na produção de bens intensivos em recursos naturais. Todavia, a maneira que os agentes econômicos encontram para ocupar uma parcela do mercado é por meio da inovação e desenvolvimento tecnológico. Isto posto, em um cenário em que o conteúdo tecnológico é requisito mínimo para disputar uma parcela do mercado e ter ganhos de competitividade e elevar o saldo da balança comercial, torna-se fundamental o desenvolvimento de políticas que estimulem a inovação (HERMIDA; XAVIER, 2012). Para tanto, Lall (2000a apud NEGRI, 2005) elenca alguns motivos pelo qual políticas de industriais de inovação podem fomentar o aumento da intensidade tecnológica das exportações como, por exemplo, a criação de barreiras à entrada em mercados de produtos mais tecnologicamente avançados, onde as firmas podem, com isso, obter lucros extraordinários. Além disso, processos mais intensos em tecnologia podem vir a ter ganhos de produtividade, transbordando para outros setores.

A característica marcante do comércio sino-brasileiro é que o Brasil transfere insumos para a China e tem que exportar volumes cada vez maiores para equilibrar a sua balança comercial, enquanto o país asiático, que tem um peso elevado na balança comercial brasileira, exporta menos bens, mas consegue fazer frente às exportações brasileiras. Esse traço do comércio é muito evidente e marcante e vem cada vez mais se aprofundando.

5 - REFERÊNCIAS

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Porque o Brasil é um grande exportador para a China?

Os produtos brasileiros exportados para a China e aqueles que vêm de lá são, atualmente, de naturezas variadas: o Brasil exporta basicamente commodities, já a China, exporta itens manufaturados, prontos ou em peças a serem montadas aqui, além de outras tecnologias.

O que a China exporta para o Brasil?

Responsável pela maior parte da produção global desses itens, a China exporta para o Brasil principalmente equipamentos de telecomunicações. A categoria representa 13% das importações brasileiras vindas do país asiático e movimentou US$ 3,5 bilhões no período entre janeiro e outubro de 2020.

Qual é a relação comercial entre Brasil e China?

Vale ressaltar que a balança comercial entre o Brasil e a China é favorável, ou seja, o Brasil exporta um valor maior do que ele importa, e a China é o país para o qual o Brasil mais exporta. Um exemplo do sucesso das trocas comerciais foi o ano de 2021, o Brasil apresentou um superávit de quase US $40 bilhões.

Quem é o maior comprador da China?

Os principais parceiros comerciais da China são os Estados Unidos, Hong Kong, Coreia do Sul, Japão, Vietnã, Austrália e Alemanha. ... Principais países parceiros..