Quais as províncias que resistiram e tomaram parte nas guerras da independência do Brasil?

Crise da Regência do Príncipe D. Pedro

Enquanto a esquadra real deixava o Brasil com destino a Portugal, iam-se agravando aqui as divergências originadas de velhos conflitos de interesses e disputas de autoridade. Os portugueses, com prepotência, não escondiam a intenção de reduzir os privilégios concedidos à Colônia pelo monarca. Os brasileiros, incentivados pelo ideal de independência, dominante nas antigas colônias americanas, procuravam desfazer-se incômoda tutela das Cortes e ver-se livres de agravos e humilhações.

Ao assumir a regência, D. Pedro, em manifesto ao povo, prometia respeito austero às leis, vigilância constante sobre os juízes e todo o esforço para cumprir as prescrições da Constituição que fosse promulgada em Lisboa. Pretendia melhorar a educação do povo, desenvolver a agricultura e o comércio e proceder às reformas que possibilitassem a prosperidade do país. Apelava a todos para o acatamento às leis e a manutenção da ordem pública.

A conjuntura política e econômica, todavia, não propiciava muita tranqüilidade. Grande parte das Províncias declaravam obediência às Cortes, furtando-se à autoridade do Regente. O déficit financeiro era muito grande. O erário público estava arrasado. As Províncias do Norte, cumprindo ordens de Lisboa, enviavam os saldos das rendas diretamente para Portugal. O movimento comercial declinou. Elevaram-se os preços dos artigos de consumo.

Embora D. Pedro procurasse contemporizar fazendo concessões, adotando medidas drásticas de contenção de gastos e ordenando a abolição de impostos vexatórios, crescia a animosidade entre lusitanos e brasileiros. Incidentes freqüentes traziam inquietação à comunidade e aumentavam as divergências entre facções.

Em Pernambuco, na noite de 21 de julho de 1821, o Governador Luís do Rego foi alvejado com um tiro de bacamarte. Houve muitas prisões e um sério conflito próximo à ponte de Olinda. Luís do Rego resolveu renunciar e retirar-se para a Europa. Elegeu-se uma Junta Governativa provisória, presidida por Gervásio Pires Ferreira.

Em Montevidéu houve um levante das tropas, estabelecendo-se também uma Junta de governo, sob a presidência do General Lecor. Decidiu-se que a Banda Oriental continuaria portuguesa, com a denominação já consagrada de Província Cisplatina.

Em São Paulo aclamou-se outra Junta, tendo como Presidente João Carlos Augusto de Oyenhausen e Gravenburg (depois Visconde e Marquês de Aracati).

Na Bahia, no Maranhão e no Ceará contestava-se a autoridade do Príncipe D. Pedro, prestando-se obediência diretamente às Cortes Constitucionais.

Enquanto persistia essa situação delicada, em Portugal cresciam os ressentimentos contra o Brasil, concretizando-se em freqüentes providências restritivas aos direitos e aos privilégios brasileiros. Vários deputados de nossa representação nas Cortes, como Antônio Carlos, Vilela Barbosa, Pedro de Araújo Lima, Diogo Feijó e Nicolau de Campos Vergueiro, foram obrigados a emigrar para a Inglaterra, tantas eram as coações e os vexames a que se viam submetidos.

Essa crise gerava um ambiente de inquietação e insegurança que para o Príncipe Regente se apresentava como um dilema de opção entre brasileiros ou portugueses, entre independência ou recolonização.

Tropa portuguesa nega autoridade a D. Pedro

A Divisão Auxiliadora, comandada pelo Tenente-General Jorge de Avilez Zuzarte de Sousa Tavares, também Comandante das Armas, e que fora trazida de Portugal para o Brasil por causa da Revolução de 1817 em Pernambuco, representava o principal esteio do Partido português no Rio de Janeiro.

Avilez, de temperamento autoritário e prepotente, estava disposto a intervir e não se conformava com a tendência do Príncipe de buscar uma aproximação com os brasileiros.

A Divisão arrogava-se o papel de guardiã constitucional, representante das Cortes e tutora do Regente. Quando este decidiu conceder audiências gerais, o General Avilez reclamou, considerando-as irregulares, pois em sua opinião, eram contrárias à autoridade que as Cortes se avocavam. As intervenções e ponderações do General Avilez tornaram-se audaciosas e impertinentes, colocando, às vezes, o Príncipe em situação constrangedora. Certo dia, com a intenção de praticar exercício de tiro com a tropa de milícias, D. Pedro mandou buscar no quartel da Divisão, como era costume, os canhões necessários. O General Avilez negou-se a fornecer as peças.

Não apenas os militares lusitanos, mas também os civis, partidários das Cortes, consideravam ilegal a autoridade do Regente, pois o Rei, segundo pensavam, não tinha competência para delegá-la.

Com freqüência, D. Pedro deparava-se com o dilema de transigir ou reagir. Não dispunha de força militar suficiente para enfrentar a Divisão. Restava-lhe contemporizar e ir preparando aos poucos uma base de apoio junto à opinião pública que lhe proporcionasse elementos para uma resistência adequada.

D. Pedro decide-se pelos brasileiros

Em fins de 1821 já se vislumbrava a inexorabilidade da marcha do país para a emancipação política. As tendências iam-se radicalizando progressivamente. A uns só satisfazia a completa independência do Brasil e a outros só a total submissão às Cortes de Lisboa.

A autoridade política do Príncipe Regente limitava-se, na prática, ao Rio de Janeiro, a Santa Catarina e ao Rio Grande do Sul, pois na maior parte das Províncias predominava a idéia de obediência ao governo lisboense. Tão grandes eram as contrariedades de D. Pedro que ele chegou a solicitar ao pai autorização para retornar a Portugal.

Não faltaram, entretanto, brasileiros e mesmo portugueses simpáticos à nossa causa, que procuraram prestigiar e auxiliar o Regente, mostrando-lhe a insensatez de tentar recolonizar o país.

No Rio de Janeiro a situação deteriorava-se rapidamente. Os Ministros da Regência irritavam-se com facilidade e estavam divididos. D. Diogo de Menezes – o Conde de Louzã –, insuflou a tropa portuguesa contra os brasileiros. Exaltavam-se os ânimos e aproximava-se o momento em que o Regente teria de decidir entre brasileiros ou portugueses. A oficialidade da Divisão Auxiliadora apoiava os lusitanos.

Não escondia D. Pedro a preferência pelo Brasil. Inteligente e corajoso, resolveu enfrentar a arrogância dos militares portugueses e decretou o recrutamento geral para a organização de unidades com tropa brasileira. A medida despertou indignação e protestos.

Foram divulgados os fundamentos da Constituição portuguesa que se preparava. O Conde de Louzã e outras pessoas influentes entenderam que cabia ao Príncipe jurar fidelidade a essa divulgação. Muitos acharam dispensável essa formalidade, pois o juramento já havia sido prestado. No entrechoque de opiniões, Louzã apelou para as tropas e o Príncipe, contrariado, teve de submeter-se.

Mas as forças exigiram ainda mais. Queriam o estabelecimento de um Conselho de Estado, responsável perante as Cortes, e sem cuja sanção nenhum assunto importante poderia ser decidido. Impuseram a demissão do Conde dos Arcos e de uma comissão militar integrante do Comando das Armas.

D. Pedro aceitou todas as exigências impostas, desiludido com a atitude da tropa portuguesa. O Conde dos Arcos, exonerado, embarcou para Lisboa. Criou-se uma Junta, com nove membros, para auxiliar o governo. Nomearam-se dois adjuntos para o Comandante das Armas. O Regente sentia necessidade da criação de um Exército brasileiro que lhe emprestasse prestígio e amparasse sua autoridade.

Em Lisboa, as Cortes rejubilaram-se com o regresso de D. João, submisso e humilhado. As manifestações políticas adversas ao Brasil aumentaram de intensidade, como se podia constatar pela grande quantidade de decretos de Lisboa. Reagiram os brasileiros a esse estado de coisas. A exaltação dos ânimos atingiu um ponto culminante quando chegaram de Portugal os decretos nºs 124 e 125, suprimindo os tribunais do Rio de Janeiro e ordenando o regresso do Príncipe "para viajar na Europa e aprimorar a sua educação na França, Inglaterra e Espanha". Inúmeras entidades políticas, governamentais e privadas subscreveram moções solicitando a permanência de D. Pedro. Ele, no entanto, hesitava, antevendo as grandes repercussões de sua atitude. A 5 de janeiro, chegou a representação de Minas Gerais, trazida pelo Presidente da Junta, Desembargador Fonseca Vasconcelos. No dia 8, a Gazeta Extraordinária publicou a representação da Junta de São Paulo. O dia 9 de janeiro foi marcado para a audiência de entrega da petição dos fluminenses. José Clemente Pereira, Presidente do Senado da Câmara (hoje Câmara dos Vereadores), pronunciou um discurso histórico em que destacava que "a partida de Sua Alteza Real seria o decreto que teria de sancionar a independência do Brasil". Emocionado, o Príncipe deu uma resposta evasiva, sem definir sua posição. Percebendo o clamor popular, mandou chamar José Clemente à tarde e determinou que riscasse do Livro de Vereança a resposta dada inicialmente e registrasse o seguinte: "Como é para o bem de todos e felicidade geral da Nação, diga ao povo que fico".

Surge um Exército comandado por brasileiros

A decisão representava um desafio às Cortes. Os oficiais da Divisão Auxiliadora procuraram esconder momentaneamente a indignação que sentiam. Contrariados também ficaram os partidários da recolonização.

O Dia do Fico transcorreu com grandes festejos e na maior ordem. Dois dias depois, entretanto, começaram a surgir indícios de anormalidade nos quartéis. A oficialidade da Divisão Auxiliadora, tendo à frente o General Avilez, buscou expedientes escusos a fim de burlar a decisão de D. Pedro. Para excitar os ânimos fez-se constar que o comandante da Divisão fora exonerado. No mesmo dia 11 o General Avilez, acompanhado de outros generais e de oficiais superiores, visitou os quartéis, provocando manifestações de solidariedade da soldadesca. As praças percorriam as ruas da cidade quebrando vidraças e provocando os brasileiros, agredindo os que reagiam.

O 3º batalhão de Caçadores, aquartelado em São Cristóvão, manteve-se fiel a D. Pedro, o que ocasionou grande aborrecimento ao comandante da Divisão.

A atitude dos militares portugueses obrigou o General Joaquim Xavier Curado (brasileiro), o Coronel Luís Pereira da Nóbrega de Sousa Coutinho (brasileiro) e o Brigadeiro Joaquim de Oliveira Álvares (português) a convocar imediatamente os comandados para apoiar o Príncipe Regente, que decidiu preparar-se para se antepor à afrontosa oposição que lhe faziam. Acolhendo a iniciativa dos três chefes militares, resolveu desligá-los do Comando das Armas e encarregá-los de reunir nos quartéis do Campo de Santana os regimentos de linha e os corpos de milícias integrados por brasileiros, sob as ordens diretas da Regência. Mandou aceitar voluntários na Província do Rio de Janeiro e escreveu aos governos de São Paulo e Minas Gerais solicitando reforços.

No Rio de Janeiro e arredores os cidadãos válidos, de todas as classes, acorreram aos quartéis, disputando o direito de alistar-se no Exército do Príncipe. Em poucas horas formou-se uma legião, vibrante de patriotismo, clamando guerra ao insolente estrangeiro. Mais de 6 mil homens, incluindo padres, pegaram em armas.

Tão iludido estava o General Avilez que, ao ter notícia da concentração das forças brasileiras nos quartéis do Campo de Santana, determinou ingenuamente a todos os oficiais e praças que lá se achavam para que se recolhessem às suas residências e devolvessem aos depósitos o material bélico de que dispunham. Mas teve a desagradável notícia de que as forças do Campo de Santana só recebiam ordens de Sua Alteza Real, o Príncipe D. Pedro.

Percebendo a disposição das forças brasileiras, Avilez dirigiu-se a São Cristóvão para apresentar a D. Pedro uma notificação formal de desobediência de um grupo de militares. O Príncipe respondeu-lhe que, como a tropa portuguesa estava insubordinada, dera ele próprio ordens ao General Oliveira Álvares para reunir nos quartéis do Campo de Santana as unidades integradas por brasileiros, a fim de manter a ordem pública.

O General Avilez estava perplexo quando saiu do Paço. Ao ver nas ruas o entusiasmo do povo que acorria ao Campo de Santana, resolveu voltar à presença do Príncipe para, de forma hipócrita, assegurar-lhe a solidariedade das tropas portuguesas. D. Pedro informou-lhe que, por já ter sido exonerado do cargo de Comandante das Armas, não mais lhe competia preocupar-se com a situação das tropas, subordinadas agora ao General Curado.

Criava-se assim, por força de circunstâncias especiais e fortuitas, uma Força Terrestre integrada por brasileiros e com aspirações genuinamente nacionais. Era o Exército brasileiro que tomava forma.

Atentado contra D. Pedro

Dominado pelo despeito, Avilez dirigiu-se ao quartel do Largo do Moura, onde, com oficiais de sua confiança, formulou um audacioso plano de seqüestro do Príncipe. Tencionava ele surpreender e prender D. Pedro na saída do teatro e levá-lo imediatamente, com a Princesa D. Leopoldina e os dois filhos, para a Fortaleza de São João, embarcando-os logo na fragata União, que estava pronta para zarpar. A ação seria rápida e não daria tempo para a reação das forças brasileiras. Contavam os conspiradores que, com sua coragem habitual, o Regente não faltaria à sessão de teatro, apesar da atmosfera tensa do momento histórico que se vivia. As circunstâncias frustraram o plano. Ao anoitecer houve um alarma geral na cidade, já que grupos de soldados portugueses provocavam desordens. Chegando ao teatro, o Príncipe notou a ausência do General Avilez e ordenou ao Brigadeiro Francisco Joaquim Carreti que mandasse recolher a soldadesca indisciplinada. Quase ao terminar o espetáculo alguém comunicou a D. Pedro que a força portuguesa se deslocava para cercar o teatro. Protegido por numerosos patriotas, ele partiu imediatamente para São Cristóvão e mandou a família para Santa Cruz. Passou a expedir ordens para enfrentar a situação. As notícias dos acontecimentos espalharam-se por toda a cidade e o clima era de revolta geral.

D. Pedro expulsa a Divisão Auxiliadora

Avilez não desistiu. Reuniu as forças e tomou posição no Morro do Castelo, preparando-se para bombardear a cidade. O Campo de Santana apresentava extraordinário aparato bélico. Além das forças de primeira linha, ao lado do Príncipe, encontravam-se vários regimentos de milicianos e batalhões patrióticos, formados na ocasião. O povo, na praça, explodia em aclamações. O Coronel Oliveira Álvares, mesmo enfermo, coordenava as ações.

Ao amanhecer, chegou o velho General Xavier Curado, que foi recebido por ovações populares e leu uma proclamação de D. Pedro concitando todos os brasileiros a pegar em armas contra a "insubordinada e anarquizadora Divisão portuguesa", oferecendo-se ele próprio para tomar a frente dos patriotas.

Com efeito, por volta das oito horas da manhã, o Príncipe apareceu no acampamento, sendo recebido com grande entusiasmo.

As duas forças antagônicas estavam prontas para o confronto. Apesar da superioridade dos portugueses em organização e armamento, não restava dúvida que o fervor patriótico dos brasileiros os levaria de roldão.

Antes de ordenar o ataque o Príncipe preferiu intimar o general português a retornar a seus quartéis e preparar-se para embarcar para Lisboa. Avilez respondeu com arrogância que sentia não poder obedecer-lhe por ser a sua ordem contrária às decisões das Cortes. Ao cair da tarde, recebendo nova intimação, comprometeu-se a transferir as forças para o outro lado da baía, contanto que D. Pedro se responsabilizasse perante as Cortes pela retirada da Divisão e das tropas pagas.

No mesmo dia as forças portuguesas atravessaram a baía e estacionaram em Armação, em Niterói. Procurou ainda o General Avilez ganhar tempo, tentando furtar-se ao compromisso de voltar para o Reino. Contava com reforços de Lisboa, a fim de restabelecer o controle da situação. Evidenciou sua intenção ao mandar distribuir manifesto à população do Rio de Janeiro e tentou apossar-se da Fortaleza de Santa Cruz. Correu a notícia de que pretendia internar-se no país com toda a tropa, reunindo-se depois na Bahia com o General Inácio Luís Madeira de Melo.
Por essas razões o Príncipe D. Pedro ocupou o Campo do Barreto, impedindo a comunicação dos portugueses com o interior. Simultaneamente, bloqueou por mar o acampamento em Armação. A Fortaleza de Santa Cruz continuou com os brasileiros.

Prontas as embarcações para o transporte das forças, os lusitanos protelaram o embarque, usando vários pretextos. Esgotou-se a paciência do Príncipe e a 9 de fevereiro, embarcado na fragata União, ele se dirigiu a Niterói e intimou Avilez à retirada. Diante das evasivas dos oficiais, D. Pedro retrucou que, se no dia seguinte não iniciassem o embarque, mandaria abrir fogo com os meios de que dispunha. Avilez cedeu à intimação. A 15 de fevereiro levantaram ferros, de volta a Portugal, os navios que transportavam a Divisão. Um dos batalhões desembarcou na Bahia, reforçando as tropas do General Madeira.

A expulsão das forças portuguesas marcou novo compasso na preparação da independência brasileira, sublimando o prestígio do Príncipe Regente, em cujas mãos se colocou o destino de nossa emancipação.

As Cortes já haviam decidido enviar outras tropas ao Brasil; 1.200 homens guarneciam a divisão naval comandada pelo Chefe-de-Divisão Francisco Maximiano de Sousa. Atingiram a entrada da baía da Guanabara a 5 de março, permanecendo ao largo vigiados pelas fortificações costeiras e navios fiéis ao Príncipe. A missão fracassou, não tendo logrado o intento de obrigar o Príncipe D. Pedro a retornar a Portugal; antes 894 homens desertaram, entre oficiais e marujos – alguns dos quais integravam a guarnição da fragata Real Carolina – passando todos ao serviço do Príncipe. O restante retornou a Portugal duas semanas depois.

José Bonifácio e a crise em São Paulo

José Bonifácio de Andrada e Silva fora nomeado Ministro do Reino e de Negócios Estrangeiros. Desde logo dedicou-se à reconstrução da unidade do país esfacelada pela atitude das juntas provinciais e, assessorando de forma permanente o Príncipe, lutou pela independência política do país. Conseguiu a aprovação do decreto que estabelecia que nenhuma lei promulgada pelas Cortes portuguesas teria validade sem o Cumpra-se do Regente; promoveu a ida do Príncipe a Minas Gerais para acabar com as desordens provocadas pelos adeptos do regime republicano.

 Em São Paulo, a Junta fracionou-se em dois grupos: um deles constituído por Martim Francisco, irmão de José Bonifácio, e o Brigadeiro Manuel Rodrigues Jordão; o outro tinha como principais figuras o Coronel Francisco Inácio de Sousa Queiroz, João Carlos de Oeynhausen (Presidente da Junta) e José da Costa Carvalho (Ouvidor da Comarca), considerado mentor dos dois primeiros.

Em virtude das providências enérgicas e radicais adotadas para evitar a corrupção administrativa e as sedições internas, Martim Francisco caiu no desagrado do Presidente da junta e do Coronel Francisco Inácio. Solicitou-se a sua expulsão da Província e ele embarcou para o Rio de Janeiro, enquanto o Brigadeiro Jordão era mandado para Santos.

José Bonifácio acolheu Martim Francisco e convenceu o Príncipe a chamá-lo para o ministério e ao mesmo tempo convocar os três líderes da Junta paulista para prestarem esclarecimentos. Mas eles não atenderam ao chamamento.

D. Pedro então deslocou para São Paulo várias unidades militares, nomeando o Marechal João Arouche de Toledo Rendon Governador das Armas da Província.

Embora o Presidente Oeynhausen se tenha apressado em cumprir as ordens e partir para o Rio, a crise só teria fim com a presença do Regente em São Paulo.

Norte – grande preocupação

Em todo o norte do país predominavam os partidários das Cortes, conquanto já se notasse, com o passar dos tempos, alguma tendência em apoiar o Príncipe. A Província que mais preocupava o Regente e os patriotas do Rio de Janeiro era Pernambuco. O tradicional espírito nacionalista pernambucano, associado aos recursos naturais da Província, poderiam ajudar a contrabalançar a atitude reacionária da Bahia.

D. Pedro, de comum acordo com os patriotas do Rio de Janeiro, enviou a Pernambuco o jovem António Menezes Vasconcelos de Drummond, que agiu com habilidade e eficiência. A Junta de Pernambuco acabou dando adesão formal à política do Príncipe Regente. Embarcara pouco antes para a Europa o Comandante das Armas, José Maria de Moura, que impedira o desembarque de reforços militares vindos de Portugal.

Na Bahia, a nomeação do Brigadeiro Inácio Luís Madeira de Melo para o Comando das Armas ocasionou dificuldades, já que os brasileiros o consideravam seu maior inimigo.

A Junta governativa não deu posse ao General Madeira, investindo no cargo o Brigadeiro Manuel de Freitas Guimarães, líder da corrente brasileira. No entanto, agindo com determinação, Madeira de Melo submeteu a Junta e os patriotas, obrigando-os a ficar fora da capital.

A Bahia constituiria um dos últimos baluartes do domínio português no Brasil e palco de muitas lutas pela independência política.

Independência ou Morte!

Embora o Marechal Cândido Xavier de Sousa, paulista mandado de Santos para pacificar São Paulo, informasse ter cumprido a missão e o Regente tivesse demitido o Presidente da Junta, esta rogou a D. Pedro que estabelecesse na Província um governo semelhante ao de Minas Gerais e informou que eram infundadas as desconfianças para com o governo local.

O Príncipe resolveu ir pessoalmente a São Paulo, saindo do Rio de Janeiro a 14 de agosto de 1822. O percurso era longo e acompanhava o vale do Paraíba. Na capital paulista, D. Pedro foi muito bem recebido. Visitou Santos e quando regressava a São Paulo recebeu, nas proximidades do riacho Ipiranga, na tarde de 7 de setembro, o correio de José Bonifácio, Paulo Bregaro, que trazia importantes despachos de Lisboa, com comunicações e comentários do Deputado Antônio Carlos, dos Ministros e da Princesa Leopoldina. Os documentos continham restrições humilhantes adotadas pelas Cortes, diminuindo a autoridade do Regente, anulando a convocação do Conselho de Procuradores Gerais das Províncias e nomeando novo ministério para o Brasil.

Anexos estavam também um decreto que mandava processar o governo de São Paulo e os signatários das petições de permanência de D. Pedro, uma carta de D. João VI revelando claramente que sofria coação e vários outros documentos oficiais e particulares.

Segundo várias testemunhas, depois de ler a documentação D. Pedro pediu a opinião do Padre Belchior e recebeu a sugestão de tornar o Brasil independente de Portugal. Convocou, naquele mesmo momento, todos os participantes do séquito, expôs-lhe a situação e a descabida imposição das Cortes, em relação ao Brasil. Num gesto veemente arrancou do uniforme o laço português, dizendo: "Independência ou morte!"

Com a chegada da comitiva a São Paulo espalhou-se rapidamente a notícia dos acontecimentos à margem do Ipiranga. À noite, no teatro local, D. Pedro foi aclamado pelo Cônego Ildefonso Xavier Ferreira como primeiro Rei do Brasil.

Eram dias de glória. No Rio de Janeiro, em São Paulo e várias outras partes do país, o povo assistiu a entusiásticas comemorações da proclamação da autonomia brasileira. Mais uma nação soberana surgia no mundo. Não ficaria, entretanto, isenta de sacrifícios e de derramamento de sangue, por essa conquista. Portugal ainda dispunha aqui de muita força política e militar.

Bravura e sacrifício na resistência baiana

À Bahia reservava-se o destino de ser o teatro das maiores violências na luta por nossa emancipação. Desde fevereiro de 1822 os deploráveis episódios originados com a intervenção do Brigadeiro Madeira mostraram a disposição autoritária dos portugueses. A cidade presenciara, após a tomada do Forte de São Pedro, a cenas de selvageria da soldadesca lusitana. No Convento da Lapa, arrombando portas e derrubando altares, assassinaram cruelmente a bondosa Sóror Joana Angélica.

As arbitrariedades estimularam o anseio de libertação. Muitos brasileiros e amigos do Brasil abandonaram a capital da Província em busca do Recôncavo, onde estava se formando um núcleo de resistência.

A 25 de junho de 1822, criou-se na vila de Cachoeira uma junta interina de defesa para dirigir a reação nacionalista. O movimento revolucionário estendeu-se a outras vilas. A junta passou a convocar todos os que pudessem de alguma forma colaborar e instituiu uma caixa militar para a coleta de recursos. Nas vilas sublevadas mobilizaram-se milicianos e voluntários e, diante da escassez de armas e munições, fundiram-se peças de bronze, de ferro e de chumbo dos engenhos para a produção de material bélico.

Iniciou-se uma luta de guerrilhas contra os lusitanos. Dela participavam também crianças, padres, mulheres e até índios, utilizando arco e flecha. Surgiram as companhias de Bellona e de Mavorte, a de voluntários cavaleiros, a dos Pedrões ou encourados, de sertanejos de Rio das Contas (comandados por Frei José Maria Brayner), dos pretos libertos, dos voluntários do Príncipe (também chamados Periquitos), dos índios (chefiados por Bartolomeu Jacaré) e muitos outros grupos que não dispunham de armamento comparável ao dos portugueses, mas que lutavam com bravura e patriotismo.

Foram esses brasileiros destemidos que se apossaram da escuna inimiga que bloqueava o porto de Cachoeira, que construíram trincheiras, que interditaram as passagens nos rios Cachoeira e Santo Amaro, que inquietaram as tropas lusitanas, cortando-lhes as comunicações e prejudicando-lhes o abastecimento.

Entre os integrantes dessa notável resistência distinguiu-se a figura de Maria Quitéria de Jesus que, empolgada pela causa da Independência abandonou sua casa, vestida de homem, e assentou praça num regimento, sendo depois transferida para o Batalhão dos Periquitos. Em fins de 1822, à frente de um grupo de mulheres, impediu um desembarque adversário na foz do rio Paraguaçu. A heroína brasileira demonstrou patriotismo em outros episódios arriscados, recebendo, mais tarde, uma condecoração do Imperador e o soldo de alferes de linha.

Forças nacionais no Recôncavo Baiano

Após a definição das vilas confederadas de Cachoeira, São Francisco e Santo Amaro, em junho de 1822, o movimento cresceu, alastrando-se pela Província. Urgia coordenar as ações e orientá-las convenientemente. Era preciso recuperar a capital da Província, dominada pelas forças do General Madeira.

Da vila de São Francisco partiu o Alferes Francisco de Faria Dutra com um contingente do 1º Regimento de Linha e ocupou posição em Pirajá, nas alturas próximas ao local denominado Coqueiro. Outra força, composta de milicianos, provinha da capital, ao comando do Coronel Rodrigo Falcão Brandão para operar na região chamada Cabrito. Mais tarde chegou o Tenente Alexandre Gomes de Argolo Ferrão, com um batalhão de caçadores.

Aumentavam aos poucos os efetivos militares que bloqueavam a cidade. Entre os que se juntaram cita-se um corpo de tropa constituído de negros, formando a Guarda dos Henriques, comandada pelo Major Manuel Gonçalves da Silva; o nome da corporação era homenagem ao negro Henrique Dias, que tivera destacada participação na guerra contra os holandeses.

O Tenente-Coronel Felisberto Gomes Caldeira dirigiu as primeiras obras de fortificação na vila de São Francisco de Sergipe do Conde, na ilha de Cajaíba e em várias outras, a fim de impedir o acesso das canhoneiras portuguesas. Fortificaram-se as ilhas das Fontes, Vacas, Frades, Bom Jesus, Madre de Deus e Santo Antônio. Em terra firme estabeleceram-se fortificações em Caipé, Marapé, Mataripe, Paramirim, Sambará, Engenho do Conde, Gamboa, Encarnação, Barra do Carcez e outros locais.

Mobilizaram-se várias unidades, apesar da dificuldade para a obtenção de armamento.

Um dos membros da Casa da Torre, Tenente-Coronel Joaquim Pires de Carvalho e Albuquerque, descendente de Garcia d'Ávila, marchou com alguns elementos e acampou em Pirajá, assumindo o comando das forças que se encontravam na região.

Os brasileiros se preparavam, mas o Brigadeiro Madeira subestimava a importância do movimento, convicto de que suas tropas, mais bem armadas e adestradas, poderiam aniquilar as forças nacionalistas a qualquer momento. O chefe lusitano considerava incompetentes os comandantes dos milicianos, já que eram homens de engenho e do sertão, com armamento insuficiente e munição escassa.

A falta de homogeneidade das forças rebeldes, a descentralização e o equipamento obsoleto seriam fatores da derrota brasileira. Limitou-se o Brigadeiro a mandar efetuar um rigoroso policiamento da cidade, fechando o acesso aos arredores com postos avançados, mantendo uma permanente atividade de reconhecimento no Recôncavo e realizando patrulhamento marítimo.

Madeira de Melo ocupou a ilha de Itaparica a 10 de julho, sem encontrar resistência. Resolveu abandoná-la por julgá-la, erroneamente, destituída de valor estratégico. Preocupado com os problemas de governo, desinteressou-se das atividades dos nacionalistas que, ocupando a Feira do Capuame, bloquearam o acesso ao sertão, donde provinha o suprimento para a capital.

Labatut

A necessidade de organização e enquadramento militar dos patriotas baianos não passou despercebida ao Príncipe, que autorizou seu Ministro da Fazenda, Martim Francisco Ribeiro de Andrada, a contrair com particulares um empréstimo de 400 contos de réis.

Assim, preparou-se no Rio de Janeiro uma força expedicionária sob o comando do General francês Pierre Labatut, participante das campanhas de Napoleão Bonaparte na Europa, especialmente contratado pelo Príncipe.

Labatut seguiu para o norte numa esquadrilha comandada pelo Chefe-de-Divisão Rodrigo Antônio de Lamare. Não podendo desembarcar em Itapoã, Torre de Garcia d'Ávila ou outro ponto favorável do litoral baiano, foi até Alagoas e desembarcou em Jaraguá, de onde marchou para Recife, a fim de obter reforços. A 4 de setembro de 1822 regressou àquela região, transportando, através do São Francisco, 200 homens para, de surpresa, atacar o Brigadeiro Pedro Vieira em Sergipe.

A resistência portuguesa foi-se desmoronando facilmente e Labatut prosseguiu vitorioso de Laranjeiras para São Cristóvão, que seria a futura capital sergipana. O general procurou tranqüilizar os ânimos e pacificar a Província.

Chegando à Feira do Capuame em 28 de outubro, estabeleceu logo o quartel-general em Engenho Novo. Ocupou vários pontos importantes e reforçou as posições de Coqueiro, Cabrito e Pirajá. Designou Felisberto Gomes Caldeira Comandante das forças de Itapoã, despachou Rodrigo Falcão para Cachoeira, requisitou suprimentos para a tropa e procurou aumentar os efetivos em Cabrito e Pirajá. Solicitou munição, gêneros alimentícios e gado para o abastecimento de suas forças. Percebeu a importância das posições do Recôncavo e a premente necessidade de reforçá-las.

Sentia-se a ação de comando de Labatut. Todas as providências tomadas, como o deslocamento de forças, a distribuição de reforços e o reajustamento do dispositivo, deram grande vitalidade aos preparativos para a defesa. A par disso, as medidas administrativas adotadas ou recomendadas exerceram influência positiva no moral das tropas.

Cinco dias depois da chegada, as tropas tinham sido reorganizadas e distribuídas por brigadas. Fora criado um arsenal de guerra em Feira do Capuame, sendo sua direção confiada ao Capitão João Sepúlveda de Vasconcelos.

Em 4 de novembro já tinham sido reequipados todos os postos ribeirinhos. Em Cabrito havia um arsenal de guerra. A maquinaria do engenho e a fábrica de artefatos de cobre transformaram-se em usina, onde Antônio Marques, filho do proprietário, incumbira-se de fundir peças de material bélico e recondicionar armas e munições apreendidas dos portugueses. As forças brasileiras se estendiam de Cabrito a Passé. Sob o controle de Manuel Pinto de Assunção e José Ribeiro Sanches alguns destacamentos vigiavam ilhas, praias, ancoradouros e arraiais. Em Itacaranha, o ponto chave da defesa – segundo Labatut – concentrou-se o batalhão de negros e a companhia de caçadores de Santo Amaro.

A tropa de artilharia, ainda em número reduzido, foi colocada em posições adequadas, como na Boca do Mato, na orla da cidade e na ilha de Maré, sob a supervisão do Major Eusébio Barreiras, inspetor de Acupe e Dourado.

O Brigadeiro Madeira reconheceu que sofrera um envolvimento completo e tentou rompê-lo, mas foi sempre repelido. Novamente procurou apossar-se da ilha de Itaparica, mas não obteve êxito.

Intensificaram-se os choques entre forças portuguesas e brasileiras, prenunciando confrontos decisivos entre os antagonistas.

Pirajá e Cabrito

Pirajá não constituía para a força brasileira simples povoação. Pela posição dominante representava um ponto fundamental para a defesa. Pelo terreno elevado em que ficava o lugarejo passava a antiga e tradicional estrada das Boiadas, ligando a capital com o norte da Província. A posse de Pirajá representava para os nacionalistas não apenas o domínio da enseada de Itapagipe, mas significava a interrupção na entrada de suprimentos para a cidade.

Não surpreenderia que mais cedo ou mais tarde o Brigadeiro Madeira procurasse controlar aquela região. O plano de operações concebido para 8 de novembro de 1822 consistia em atacar o exército nacionalista buscando romper o centro do dispositivo para aniquilar uma parte e obrigar o restante a retirar-se para o norte. Dessa forma ficaria rompido o cerco.

Ao amanhecer do dia previsto, uma tropa de infantaria portuguesa desembarcou em Itacaranha e Plataforma, comandada pelo Coronel João de Gouveia Osório, da Legião Constitucional lusitana. Ao mesmo tempo, outras tropas foram lançadas sobre Cabrito e ameaçaram a retaguarda brasileira. No entanto, chegaram reforços e os nacionalistas apoiados em Coqueiro, Bate-Folha e São Caetano resistiram. Os brasileiros estavam sob o comando do Tenente Alexandre de Argolo Ferrão.

Nas encostas de Pirajá a luta assumiu grandes proporções. Segundo o Barão do Rio Branco, o comandante da tropa em posição, Tenente-Coronel José de Barros Falcão, que trouxera reforço de Pernambuco, possuía cerca de 1.300 homens pertencentes ao batalhão de Pernambuco, ao Batalhão de Milicianos do Rio de Janeiro, à Legião de Caçadores da Bahia, ao Corpo Henrique Dias e a um destacamento do Regimento de Infantaria da Bahia, comandados respectivamente pelos Major Joaquim Silva Santiago, Tenente Alexandre de Argolo Ferrão, Major Manuel Gomes da Silva, Alferes Francisco de Faria Dutra, além de uma bateria de artilharia.do Rio de Janeiro.

O efetivo português englobava os 1º e 2º batalhões da Legião Constitucional, o 4º e 10º Regimentos de Infantaria e um contingente de artilharia.

Depois de cinco horas de duração a luta não apresentava resultados decisivos. Em dado momento, um violento esforço dos portugueses quase rompe a linha brasileira, ameaçando dividi-la em duas partes.

As colunas lusas avançavam sobre as alturas de Pirajá quando o Coronel Barros Falcão, a fim de evitar o envolvimento, ordenou a retirada. Conta Accioli, contemporâneo do episódio, que o corneteiro Luís Lopes, num rasgo de iniciativa, ao invés de obedecer, tocou com convicção e a plenos pulmões "Cavalaria, avançar!". As tropas portuguesas vacilaram, surpresas, e logo em seguida, ouviram o segundo toque, "Cavalaria, degolar!"

Hesitantes recuaram os portugueses enquanto os brasileiros, animados, avançavam, perseguindo os adversários até a praia, onde conseguiram reembarcar, em desordem.

Em Cabrito houve também uma debandada do adversário, a 19 de setembro de 1822. Estavam assim derrotadas as forças do Brigadeiro Madeira, com cerca de 200 baixas.

Foram muito importantes as conseqüências políticas e militares da batalha de Pirajá. O nascente Exército brasileiro conseguira impor-se, derrotando forças experimentadas e mais bem equipadas.

Os portugueses renunciaram definitivamente à conquista de posições dominantes, conformando-se em manter a capital, reconhecendo, destarte, a existência do governo de Cachoeira. Todos os suprimentos tinham de vir por via marítima, dependendo, por conseguinte, do apoio da esquadra.

Labatut passou à ofensiva em 29 de dezembro, comandando pessoalmente as forças de Pirajá e ltapoã, tentando desalojar os portugueses fortemente entrincheirados. Embora sem conseguir romper as posições defensivas o ataque revelou o espírito agressivo dos brasileiros.

Combate de 7 de janeiro em Itaparica

Em 7 de janeiro de 1823, os lusos voltaram-se uma vez mais contra a ilha de Itaparica. Empregaram uma força naval constituída de dois brigues, várias canhoneiras e 41 lanchas e lanchões. Era preciso aliviar o cerco e animar a frente interna em Salvador, cuja população, na sua maior parte, era hostil aos portugueses e estava passando fome. Por volta das sete horas da manhã os atacantes, em duas embarcações, procederam ao reconhecimento do Forte de São Lourenço, cuja defesa estava sob a responsabilidade do Major Luís Correia de Morais. Às nove e meia tentaram o desembarque, empregando o grosso da flotilha. Um destacamento atacou as trincheiras de Amoreiras, Isidoro, São Pedro e do Forte de São Lourenço. Um outro destacamento atacou também o Forte, duas canhoneiras da flotilha brasileira e as trincheiras entre o Forte e o Mocambo. Os itaparicanos defenderam-se valorosamente, sob o comando do Major António de Sousa Lima, e tomaram de assalto uma embarcação adversária. Às seis horas da tarde cessou a luta e os atacantes se retiraram.

Os pequenos combates de Conceição e de Itapoá, em fevereiro e maio de 1823, não trouxeram qualquer alteração nas posições defensivas de ambos os adversários. Embora os portugueses houvessem recebido nessa época um reforço de 2.500 homens, consideravam-se ainda impotentes para uma ação definitiva contra as forças nacionalistas. Esse contingente veio agravar mais a escassez de víveres das tropas sitiadas. Desentendiam-se o Brigadeiro Madeira e o comandante da esquadra que lhe dava apoio na baia de Todos os Santos, João Félix Pereira de Campos. O ambiente na Bahia tornava-se cada vez mais difícil, quando, agravando os problemas, surgiram a 10 de maio de 1823, frente à barra, velas da esquadra brasileira.

Retirada dos portugueses

A força naval compunha-se de sete navios: nau Pedro I, fragatas Nictheroy e Piranga, corvetas Maria da Glória e Liberal e brigues Guarani e Real Pedro.

D. Pedro contratara para comandá-la Lord Thomas Cochrane, almirante inglês que se distinguira nas lutas pela independência do Chile. Igualmente foi contratado um excelente grupo de oficiais ingleses, entre os quais John Pascoe Grenfell, Thomas Crosbie, Benjamin Hayden e James Shepherd, que prestaram grandes serviços à Marinha nesses momentos difíceis de nossa formação política. Podem ser acrescentados John Taylor, que desertou da fragata inglesa Doris, e o norte-americano David Jewett.

A esquadra portuguesa tinha 13 navios: uma nau, cinco fragatas, cinco corvetas e dois brigues.

O primeiro combate deu-se a 4 de maio de 1823, no litoral da Bahia, sem que houvesse engajamento geral de forças e resultado decisivo. Cochrane estabeleceu uma base na enseada do Morro de São Paulo e certa feita, aproveitando-se de uma noite escura, entrou no porto para efetuar reconhecimento. Destacou dois navios, a nau Pedro I e a corveta Maria da Glória para interceptar os suprimentos destinados a cidade. Tentava-se fechar o cerco em torno da capital.

Surgiram algumas divergências entre os comandantes das forças brasileiras. Destituído e preso, o General Labatut foi mandado para o Rio de Janeiro a 2 de maio de 1823. A Junta de Cachoeira nomeou comandante o Coronel José Joaquim de Lima e Silva que, a 3 de junho desencadeou novo ataque contra as posições inimigas, sem resultado significativo.

A situação das forças portuguesas era cada dia mais precária. Hostilizado constantemente pela população, sujeito a privações e aborrecimentos, o Brigadeiro Madeira começou a desanimar. Enquanto de seu lado tudo escasseava, para os nacionalistas brasileiros crescia o entusiasmo e o vigor combativo das tropas cujo efetivo somava mais de 11 mil homens, provenientes da Bahia e de várias Províncias. De Minas viera pelo sertão o Regimento de Infantaria Auxiliar de Vila Nova da Rainha (Caeté), só regressando à Província em 1829.

Os navios de Cochrane tornavam difícil a entrada de reforços mandados de Lisboa. Ao findar de junho os portugueses, em conselho de guerra, decidiram-se pela retirada, utilizando todos os barcos disponíveis. Concluíram-na precipitadamente a 2 de julho de 1823. O exército libertador, tendo à frente o Coronel José Joaquim de Lima e Silva, entrou triunfalmente em Salvador.

Após acompanhar a frota portuguesa até 4º de latitude norte, Lord Cochrane ordenou que o comandante da fragata Nictheroy, Capitão John Taylor, perseguisse os navios inimigos: este destemido oficial e sua tripulação, na qual se encontrava o jovem Joaquim Marques Lisboa (futuro Marquês de Tamandaré), capturaram 16 embarcações lusas, chegando até águas portuguesas perto da foz do rio Tejo.

Lutas da independência no Nordeste

Não foi sem grandes sacrifícios e derramamento de sangue que o Nordeste se integrou na pátria independente. As populações pagaram pesado tributo nas lutas, principalmente devido à resistência do Comandante das Armas da Província do Piauí, Major João José da Cunha Fidié, que era um oficial de elite, culto e poliglota, experimentado nas guerras napoleônicas, de grande bravura pessoal, pertencente à boa estirpe de soldados profissionais e de engenheiros que defendera a terra, ajudara a expandir seus limites e a enriquecê-la.

A iniciativa da reação dos brasileiros coube ao Coronel Simplício Dias da Silva, que lançou o brado de revolta na vila de São João do Parnaíba. Informado do fato, o Major Fidié deslocou-se rapidamente de Oeiras, capital da Província, para o litoral, cobrindo, em pouco tempo, os 700 quilômetros de distância. O Coronel Simplício, surpreendido pelo rápido deslocamento de Fidié, dirigiu-se para o Ceará à procura de auxílio. Toda a sua família foi presa e os bens foram confiscados e levados para bordo do brigue português Infante D. Miguel, que viera do Maranhão.

A revolução alastrou-se pela Província. De todas as partes chegaram dezenas de voluntários dispostos a lutar pela independência do país.

Fidié tentou regressar a Oeiras, mas não obteve êxito. Os independentes do Piauí, reforçados por maranhenses e cearenses, ofereceram-lhe combate perto de Campo Maior, no leito vazio do rio Jenipapo, em 13 de março de 1823. Apesar da derrota, os brasileiros apreenderam os trena de retaguarda do adversário, causando-lhe embaraço. Convidado pela Junta maranhense a defender Caxias, Fidié se deslocou em abril de 1823 para a região e fortificou a elevação denominada Taboca.

Durante três meses os portugueses resistiram em Caxias, cercados por milhares de independentes – maranhenses, piauienses e cearenses, comandados desde meados de julho pelo chefe sertanejo cearense José Pereira Filgueiras, que acorrera com numerosa expedição de vaqueiros e sertanejos, a pé e a cavalo.

Reduzido a uma situação crítica, sem nenhuma possibilidade de receber reforços ou suprimentos, Fidié passou o comando a 31 de julho de 1823. Capitulava a praça de Caxias, onde as forças vitoriosas entraram em 1º de agosto.

Desordem e crueldade no Pará

Retirados os portugueses da Bahia, Lord Cochrane deslocou-se para o Maranhão, com a nau Pedro I, chegando a São Luís em 26 de julho. Ameaçando de destruição a cidade com disparos elevados, libertou a capital maranhense. Em seguida, aprisionou o brigue de guerra lusitano Infante D. Miguel e vários outros navios no porto.

Pouco tempo mais tarde Cochrane mandou para o Pará o Capitão John Pascoe Grenfell com a missão de pacificar a Província. O quadro estava confuso por causa das constantes divergências entre as lideranças locais. Fracassara a rebelião libertadora chefiada pelo Capitão Boaventura Ferreira da Silva e pelos Alferes Antônio Loureiro Barreto e Mariano de Oliveira Belo: tinham sido presos os chefes e outros implicados.

Grenfell chegou a Belém a 10 de agosto de 1823 no brigue Infante D. Miguel, cujo nome fora mudado para Maranhão. Mediante o mesmo ardil que Cochrane usara diante de São Luís, dominou a situação e estabeleceu uma junta governativa composta de quatro militares – Coronel Geraldo José de Abreu, Capitão José Ribeiro Guimarães, Porta-Bandeira Félix Antônio Clemente Malcher, Capitão João Henrique de Matos – e do Cônego João Batista Gonçalves de Campos.

Verificando-se grande agitação popular em 15 de outubro, inflamada pela palavra do Cônego Batista de Campos, Grenfell conseguiu restabelecer a ordem, apoiado em seus marujos e em alguns populares. Presos vários agitadores, Grenfell fuzilou cinco, para exemplo, remeteu o cônego preso para o Rio de Janeiro e confinou outros 256 no porão do navio São José Diligente (depois rebatizado Palhaço), onde quase todos morreram asfixiados por cal virgem derramada pelos carcereiros. Só quatro escaparam com vida. Preso e submetido a conselho de guerra, Grenfell conseguiu provar sua inocência no episódio.

A Província continuou intranqüila. Só serenaram os ânimos no segundo reinado, graças à ação do Tenente-General Francisco José de Sousa Soares de Andréa.

Cisplatina, derradeiro bastião do domínio português

Após a declaração da independência brasileira, dividiram-se as tropas da guarnição de Montevidéu. O General Lecor declarou-se ao lado de D. Pedro I, instalando o quartel-general em Maldonado. O General Álvaro da Costa assumiu o comando dos corpos de tropa fiéis à Coroa portuguesa, permanecendo em Montevidéu. O povo uruguaio passou a assistir à luta entre as duas facções. Alguns orientais tomaram partido. Oribe, por exemplo, ficou com os portugueses e Rivera com os brasileiros.

Durante 17 meses, com 4 mil homens entrincheirados em Montevidéu, Álvaro da Costa resistiu ao cerco imposto pelo General Lecor, por terra, e pela Divisão Naval, por mar, que era fiel a D. Pedro. Tropas vindas do Rio Grande do Sul reforçavam os meios com que contava Lecor.

Percebendo a inutilidade da resistência Álvaro da Costa capitulou em 18 de novembro de 1823, embarcando para Lisboa com a Divisão de Voluntários Reais. Caía o último baluarte do domínio colonial português em terras americanas. Tremulava de norte a sul do país o pavilhão imperial verde e amarelo.

Três fatos significativos

Durante as lutas pela Independência, particularmente no Recôncavo, teve origem a Marinha de Guerra do Brasil, quer pela organização da força naval do Rio de Janeiro, quer pela incorporação de oficiais ingleses e pela atuação destacada do Primeiro-Almirante Lord Thomas Cochrane, como também pela do primeiro Ministro da Marinha de D. Pedro I, Almirante Luís da Cunha Moreira. Famoso ficou João das Botas, promovido a tenente por Lord Cochrane, quando preparou, na baía de Todos os Santos, uma flotilha de barcos pesqueiros improvisadamente artilhados. As duas forças nascentes, a terrestre e a naval, irmanavam-se assim na luta pela independência política do país.

Significativamente recebiam o batismo de fogo dois militares que seriam os maiores paladinos da Força Terrestre brasileira: Tenentes Luís Alves de Lima e Silva, que era Ajudante do Batalhão do Imperador, no sítio da capital baiana, e Manuel Luís Osório, que assentou praça a 1º de maio de 1823 na tropa de cavalaria da Legião de São Paulo, a qual integrava as forças de que o General Lecor dispunha para impor o sítio de Montevidéu. Luís Alves tinha 20 anos e Osório apenas 15.
 

Quais foram as províncias que resistiram e tomaram parte nas guerras da independência do Brasil?

Nas províncias do Maranhão, Piauí, Alagoas, Sergipe e Ceará aconteceram outras tentativas de resistência que não conseguiram de fato ameaçar a ordem instituída. Além disso, os moradores da Cisplatina, atual Uruguai, também viram na transição uma oportunidade de se livrar do julgo brasileiro.

Quais foram as províncias que não aceitaram a proclamação da Independência do Brasil?

O PÓS-INDEPENDÊNCIA Após a independência ter sido proclamada, muitos portugueses que viviam no Brasil não aceitaram a independência o que levou a vários conflitos e guerras regionais como as guerras nas províncias do Grão-Pará, Bahia, Piauí, Maranhão e Cisplatina (atual Uruguai).

Quais foram as resistências que ocorreram no período da Independência do Brasil?

A independência do Brasil não foi pacífica. Depois que a sua notícia espalhou-se, uma série de regiões rebelaram-se contra o movimento e permaneceram leais aos portugueses. Esses movimentos de resistência à independência deram-se no Pará, Bahia, Maranhão e Cisplatina (atual Uruguai).

Quem participou das guerras pela independência?

A Guerra da Independência, ocorrida entre 1822 e 1824, representou a luta dos patriotas, aqueles que, imbuídos de um forte nativismo, se contrapunham à recolonização proposta pelas Cortes portuguesas.