Quais são as possibilidades de intervenção do assistente social no Serviço Social Organizacional?

Esse artigo é fruto de algumas inquietações, como assistente social no campo empresarial, especificamente, em uma empresa pública, do segmento de energia, petróleo e gás, ao longo de vinte anos. Nesse percurso foi possível vivenciar distintos espaços internos de intervenção na empresa, tais como: região de produção de petróleo e gás, na Bacia de Campos, com suas particularidades de permanência em plataformas marítimas de petróleo, segmento de distribuição de combustíveis e derivados de petróleo e várias áreas Corporativas, como Engenharia, Comunicação e Recursos Humanos.

Trata-se de uma realidade circunscrita por características de ambiguidade, que em vários momentos apontam para a lógica da racionalidade empresarial, para os indicadores e as métricas de produtividade e, por vezes, se constitui com as típicas características de uma organização de Estado. É uma corporação de economia mista com cerca de sessenta mil trabalhadores próprios 1, dispersos em diversas unidades operacionais no território nacional e no exterior, que traz em sua cultura traços de relações instituídas por uma estruturação vertical de poder e de orientação disciplinadora. Esse é um terreno fértil para a propagação de propostas teóricas, formatadas sob a égide de um discurso que valoriza os trabalhadores, mas que busca respostas “mágicas” que visam atender à elevação das metas de produtividade, desconsiderando, muitas vezes, o patrimônio técnico construído e as experiências de seus protagonistas – sua força de trabalho.

O objetivo dessa temática é analisar criticamente a intervenção do Serviço Social nesse campo empresarial, sistematizando um conhecimento que foi sendo construído historicamente, sobre a trajetória e o processo de institucionalização da profissão nessa realidade, considerando as transformações sociais, econômicas e políticas do país. É resultado de uma vivência singular, atravessada pelas principais referências históricas constitutivas, marcos e avanços importantes e eixos de intervenção.

Refere-se a um importante espaço ocupacional que necessita ser compreendido e explorado, pois congrega um quantitativo expressivo de assistentes sociais, comparativamente a outras empresas, uma vez que havia 165 assistentes sociais contratados, via processos seletivos públicos, em julho de 2015.

O serviço social em uma empresa de petróleo e gás

O processo de industrialização brasileira teve origem com os primeiros engenhos, ou seja, baseado na escravidão enquanto raiz do trabalho coletivo. Esse traço inicial marcou toda lógica de estruturação dessa área no país, tendo em vista que o coronel, para além de ser o grande proprietário dos engenhos, também abarcou o segmento empresarial.

No mesmo período em que o processo de produção industrial no Brasil se configurava tendo como base o trabalho escravo, nos países europeus se processava a Revolução Industrial, onde a classe operária se constituía como ator social, ainda que sob a égide da força, capaz de dialogar com os proprietários dos meios de produção.

Enquanto que na Inglaterra o “homem livre” negociava com o patrão e este começava a estabelecer formas para aumentar a produtividade utilizando políticas gerenciais, como a especialização nos postos de trabalho, tal como concebeu Adam Smith, no Brasil era ainda adotado o chicote como prática gerencial junto ao escravo ( VASCONCELLOS, 1997).

Quando já tinha início o processo de substituição de importações, na segunda metade do século XIX, e os operários europeus começaram a migrar para o Brasil, parte significativa da força de trabalho ainda era escrava. Esse é um cenário que possibilita ter uma série de pistas sobre os atrasos em relação aos modelos empresariais adotados em nosso país, tanto aqueles que remetem à ótica escravocrata quanto à lógica autoritária.

Portanto, o processo de industrialização no Brasil se instaurou utilizando o trabalho escravo nos engenhos de açúcar e esse quadro perdurou até o início do café, de modo que as empresas que se estabeleceram no país estavam imbricadamente atreladas à cultura da Casa Grande e ao coronelismo. A partir do crescimento da economia cafeeira, a cultura coronelista migrou do mundo rural para o universo fabril, carregando aspectos de autoritarismo, nepotismo, clientelismo, favoritismo e outros que aludem a atender aos “amigos privilegiados”.

Desse modo, as empresas brasileiras nasceram com “o gerente autoritário, a ausência da valorização da competência em favor da lealdade pessoal” ( VASCONCELLOS, 1997), não exigindo nenhum tipo de exercício de negociação e de alternativas de enfrentamento junto aos trabalhadores.

No entanto, após a Segunda Guerra Mundial, com a economia brasileira crescendo de modo mais acelerado, o modelo coronelista não mais respondia às demandas da realidade das empresas. Diante desse quadro, os referenciais teóricos de origem estadunidense, com seus paradigmas e respostas “rápidas” às questões vigentes, se mostravam como a alternativa a ser buscada. Essas foram opções importadas e “coladas artificialmente” à realidade brasileira, resultando em “algumas ilhas de racionalidade convivendo com os princípios herdados do coronelismo clássico”. Dentre estas se encontram “empresas de capital privado nacional, empresas sob o controle do Estado e multinacionais” ( VASCONCELLOS, 1997, p. 241).

Portanto, a gênese de uma empresa está estruturada por um quadro que comporta as diferentes dimensões da sociedade, refletindo as correlações de forças existentes, suas questões principais, suas contradições, enfim, todo um cenário que abarca o social, o político, o econômico, o histórico, o cultural, dentre tantos outros.

Nesse sentido, a inserção do assistente social nas áreas industriais deve ser pensada como desdobramento de uma das funções originais do capitalista na esfera da produção, ou seja, o controle e o disciplinamento dos trabalhadores.

O assistente social, por meio de sua ação técnica e política, é requisitado para responder às demandas ligadas à reprodução material da força de trabalho e ao controle da convivência entre empregado e empresa, favorecendo o aumento da produtividade no trabalho ( CESAR, 2010).

Algumas empresas, desde os anos de 1940, já possuíam assistentes sociais em seus quadros profissionais, apesar de o Serviço Social ainda se configurar de forma muito elementar e residual. Em cada espaço empresarial, a depender de suas particularidades, o assistente social era requisitado para atuar em programas de caráter educativo e na prestação de serviços sociais, aos trabalhadores e seus familiares. Portanto, o viés da funcionalidade do Serviço Social, tradicionalmente, esteve imbricado nesses mecanismos de disciplinamento e de controle dos trabalhadores, com uma proposta de intervenção que ultrapassava suas vidas no campo fabril, se expandindo para o espaço extrafabril.

Uma empresa ao contratar o assistente social delega-lhe um “mandado” para atuar diretamente junto à classe trabalhadora, demanda essa não derivada diretamente daqueles aos quais prestará seus serviços, mas do patronato que o remunera, considerando as metas definidas por este. Institui-se, então, uma disjunção entre intervenção e remuneração, entre quem postula e quem são aqueles atendidos pelos serviços do profissional ( IAMAMOTO; CARVALHO, 1988).

Esse mercado de trabalho colocou ao Serviço Social novos paradigmas de exigências para o desempenho profissional, ligado à racionalidade burocrático-administrativa, que a modernização conservadora 2 engendrou nos espaços institucionais.

Primeiramente, cabe destacar que a história do Serviço Social na Petrobras é referida ao ano de 1955. Os assistentes sociais eram classificados em um cargo denominado de “visitador social”, que correspondia a uma carreira de nível médio 3, de caráter assistencialista, em consonância com as configurações da profissão nesse período histórico. Um marco a ser destacado, em 1963, foi a criação, em sua estrutura organizacional corporativa, de uma área responsável pela implantação da assistência social, que congregava, além do Serviço Social, mais dois segmentos técnicos: o médico e o administrativo.

A partir de então, o Serviço Social passou a ser incluído no quadro técnico de nível superior, com o objetivo de estabelecer orientações técnicas corporativas para os assistentes sociais de toda a empresa, desempenhando funções ligadas ao planejamento global da área de Recursos Humanos (RH). O discurso explicitava uma atuação que enfatizava as relações de trabalho, pautada por um viés conservador. Essas atribuições corporativas se referiam ao estabelecimento de políticas e diretrizes para o gerenciamento de programas e projetos de intervenção do Serviço Social em toda a estrutura organizacional empresarial, assim como o desenvolvimento de uma base de formação técnico-operativa que garantisse a qualidade da prestação de serviços aos beneficiários desse universo empresarial, que estavam dispersos em áreas operacionais em todo território nacional.

Os anos 1970 foram relevantes para o Serviço Social, considerando a conquista de novos espaços de intervenção, evidenciando competências e habilidades na gestão socioestrutural. Os assistentes sociais, para além da assistência, passaram a ter também atribuições que propiciavam a participação na elaboração de normas de relações de trabalho; a definição da atuação do Serviço Social, em nível central e nos órgãos operacionais; a atuação em convênios voltados para programas de lazer e; estudos de questões relativas à assistência médica empresarial, dentre outras. Acrescentou-se ainda a inserção do Serviço Social em equipe multidisciplinar com a responsabilidade de conceber e gerenciar, corporativamente, diversos programas de assistência e benefícios para os trabalhadores, espaço esse até então não ocupado pela profissão.

Essa expansão ocorreu, principalmente, a partir dos anos do desenvolvimento do “milagre econômico”, tendo como sustentação as condicionantes sociopolíticas em que ele ocorre e que estabeleceram exigências de práticas apoiadoras para redução dos conflitos e de promoção da integração dos trabalhadores ao processo produtivo.

O assistente social passou a ser reconhecido por intervir desenvolvendo práticas referenciadas em construções teóricas “emprestadas” das Ciências Sociais, que eram transfiguradas em técnicas dirigidas às situações de caráter imediatista, ratificando suas funções, no âmbito do conhecimento empírico, por meio de teorias de resultados e de operações lógico-formais ( CESAR, 2010). Desse modo, o Serviço Social procurou aperfeiçoar o instrumental operativo, os padrões de eficiência, assim como elevar o padrão de sofisticação do suporte técnico à ação profissional, para adaptação do comportamento do trabalhador aos novos ritmos do desenvolvimento capitalista.

A institucionalização do Serviço Social no campo empresarial no Brasil esteve estritamente relacionada com o desenvolvimento das forças produtivas, ou seja, aos níveis de eficiência, racionalidade e produtividade e pelas necessidades de controle da força de trabalho no espaço da produção, associado ao contexto sociopolítico do regime ditatorial ( NETTO, 1990).

Esse cenário requisitou práticas profissionais capazes de exercer funções de apoio à administração do trabalho, operando na redução de conflitos e na promoção da integração dos trabalhadores às exigências do processo produtivo. Mota (1985) registrou que:

apesar de só se tornar reconhecida, em ampla escala, a partir da década de 70, a ação do Serviço Social na empresa tem suas origens em momentos anteriores, demonstrando o processo de interiorização e privatização profissional, exigido pela modernização gerencial da empresa, que responde a um momento histórico da evolução do capitalismo que requer maior eficiência e maior racionalidade no processo de trabalho ( MOTA, 1985, p.113-114).

Essas requisições se referiram à eliminação de focos de tensões sociais que interferiam no processo de produção, tais como: absenteísmo, insubordinação, alcoolismo, entre outros. A demanda institucional era de atuação nas questões relativas à vida privada do trabalhador que poderiam afetar o desempenho no trabalho, como, por exemplo, conflitos familiares, dificuldades financeiras e doenças, assim como viabilizar benefícios sociais, a fim de assegurar a manutenção da força de trabalho, suscitando um comportamento produtivo ( IAMAMOTO, 2003; CESAR, 2010).

É a partir da década de 1970, e especialmente nos anos de 1980, que a presença dos assistentes sociais nas empresas se apresentou de forma mais significativa. Refere-se a um contexto em que os trabalhadores exercitaram um expressivo processo de organização política, ou seja, a criação de partidos, sindicatos, comissões de fábrica, entre tantas outras representações.

Durante a década de 1980, o Serviço Social nessa empresa balizou sua discussão sobre a necessidade de um novo posicionamento profissional, para além das possibilidades de uma atuação voltada exclusivamente para a assistência. Nesse sentido, vários projetos foram implantados que objetivavam ultrapassar as fronteiras empresariais, reeditando antigas práticas que “invadiam” o campo da vida privada dos trabalhadores.

Nessa trajetória, diante da constatação de que o quantitativo de assistentes sociais era insuficiente para atendimento aos trabalhadores e familiares, considerando a dispersão geográfica das diversas Unidades produtivas, a complexidade dos processos operacionais e o acirramento das relações de trabalho, em decorrência de vários acidentes de trabalho, tais como: acidente de Vila Socó, em Cubatão (SP), em 25 de fevereiro de 1984 e o da plataforma de Enchova, em 16 de agosto de 1984, a empresa implementou vários processos seletivos públicos a fim de contratar novos profissionais de Serviço Social.

Assim, em virtude da magnitude das tragédias, mencionadas anteriormente, foram deslocados vários assistentes sociais de diferentes regiões do país para os respectivos locais das ocorrências, a fim de intervir junto aos trabalhadores e familiares. Por exemplo, na região da Bacia de Campos, nessa ocasião, existia apenas um único profissional de Serviço Social para atender centenas de trabalhadores em situações cotidianas. Portanto, essas foram situações de emergências que demonstraram, institucionalmente, a necessidade de se estabelecer, pela via da formação de equipes multidisciplinares, incluindo o Serviço Social, um modo de atuação conjunto, de modo a promover uma melhor articulação e otimização de recursos. Desse modo, estabeleceram-se novos procedimentos e, consequentemente, um novo espaço de intervenção multidisciplinar para atendimento aos trabalhadores e familiares quando da ocorrência de grandes acidentes de trabalho, que recebeu a denominação de “Apoio Social de Urgência” (ASU).

Esse foi um período de grande complexidade nesse campo, seja pela organização e pelos processos de trabalho, pelas contradições e inflexões sobre a vida e saúde dos trabalhadores e, ao mesmo tempo, suscitou efervescentes debates internos junto aos assistentes sociais. Acrescenta-se, ainda, a esse período, especificamente em 1985, a conclusão de um relatório global interno da empresa que apresentou um “diagnóstico” sobre a atuação do Serviço Social, suas dificuldades e limites. Esse estudo trouxe sinalizações de questões que estavam impactando o processo de intervenção profissional e que exigiam alguns desdobramentos, nos quais se destacaram: carência de suporte institucional que propiciasse o gerenciamento do trabalho e um melhor desempenho profissional; indefinição da empresa em relação às atribuições e competências do Serviço Social; e ausência de normatizações para responder às demandas dos trabalhadores, gerando respostas diversas para situações semelhantes e, consequentemente, inadequações de posicionamentos administrativos dos profissionais.

Paralelamente, no cenário de expansão do capital, empresas públicas estatais e privadas passaram a congregar em seus quadros profissionais, os assistentes sociais, uma vez que esse contexto trouxe novas exigências sociais, requerendo uma ação de caráter assistencial e educativa, tanto junto ao trabalhador quanto junto à sua família ( MOTA, 2010).

Portanto, a dinamização do Serviço Social no campo empresarial, na década de 1980, foi marcada pela negação do conservadorismo profissional e por um movimento de explicitação da dimensão política da profissão, perspectiva denominada de “ruptura do Serviço Social”. Essa linhagem colocou como questão a gênese, os princípios e as práticas a que se vinculava o Serviço Social na sua trajetória sócio-histórica ( NETTO, 1990; IAMAMOTO, 2003).

Ainda no caldo institucional da década de 1980, a empresa implantou em sua área corporativa de Recursos Humanos um setor denominado “Serviço Social”, que tinha como atribuição central estabelecer um Programa de Institucionalização do Serviço Social na empresa. Esta decisão foi fruto da pressão dos assistentes sociais e de estratégias de ação adotadas junto aos diversos espaços de poder internos, sendo um dos períodos mais importantes para a consolidação e reconhecimento profissional diante das demais categorias de nível superior da empresa. Dentre as diversas ações empreendidas por este setor, destacam-se: “discussão e estabelecimento de perfil profissional e dimensionamento do quantitativo de assistentes sociais a compor o quadro da empresa”, considerando a especificidade de seus negócios, o porte, a dispersão geográfica etc.; processos seletivos, por meio de concursos públicos, para assistente social, assim como estágio para os profissionais recém-admitidos na empresa, de modo a discutir e, paulatinamente, construir uma base estruturada mínima de conhecimento sobre esse espaço de intervenção, desafios, possibilidades e limites; estruturação de cursos de aperfeiçoamento para os assistentes sociais, reciclagem e estágios em programas específicos; implantação de um processo de informatização do trabalho do Serviço Social, de modo a se equiparar às condições existentes para outros profissionais de Ciências Humanas; estabelecimento de diretrizes para atuação do Serviço Social na empresa, a fim de caracterizar um trabalho que não estivesse atrelado somente à tradicional área da assistência; instituição sistemática de reuniões técnicas que promoviam a discussão sobre modos de fazer, intercâmbio de saberes, etc.; edição de periódico interno denominado “Temas de Serviço Social” para sistematização do conhecimento técnico; assessoria técnica às áreas corporativas de sede e às equipes de Serviço Social lotadas nas áreas operacionais e; a busca de equiparação e inclusão da carreira e cargo de assistente social aos demais profissionais ligados às Ciências Humanas, como administradores, psicólogos, médicos, advogados, economistas, etc.

O enquadramento de carreira, na época, posicionava os assistentes sociais em uma linha técnica de nível superior denominada “outros profissionais”, onde também estavam incluídos enfermeiros e bibliotecários. Esse fato demonstrava explicitamente o não reconhecimento institucional acerca do Serviço Social, uma vez que os demais profissionais de nível superior das Ciências Humanas e da Saúde estavam enquadrados em uma carreira denominada “Linha Administrativa”. Essa condição, além do não reconhecimento simbólico, gerava significativas diferenças salariais diante das demais categorias profissionais de nível superior, trazendo impactos significativos, ao longo do tempo, também em relação às possibilidades de ascensão funcional.

Por outro lado, contraditoriamente, o que se identificava no cotidiano, fruto da complexidade das questões que envolviam os processos organizacionais e as relações de trabalho, era a elevação de expectativas e de desafios postos pela empresa para o Serviço Social.

A trajetória do Serviço Social, nesse campo, apresenta um quadro onde a inserção do assistente social se mobiliza a partir de dois fundamentos centrais: a) da articulação do Serviço Social e de seu posicionamento na estrutura organizacional, uma vez que a empresa é verticalizada, segmentada e departamentalizada, apesar das reconfigurações ocorridas ao longo da história ( LEITE, 2014); b) do processo de formação profissional, incluindo os avanços teórico-metodológicos que possibilitaram, a partir da análise do contexto histórico dos movimentos conjunturais internos e externos, vislumbrar possibilidades de intervenção, apesar dos limites existentes.

O que se identificou é que o Serviço Social foi pautando sua intervenção em ações para a preservação da força de trabalho e para a mediação de conflitos que surgiam na relação capital e trabalho. Contraditoriamente, o Serviço Social foi atendendo tanto ao capital, como contratante dos serviços profissionais, quanto ao trabalho, pela via de uma atuação que foi ao encontro das demandas dos trabalhadores. Portanto, o Serviço Social foi incorporando aspectos inscritos nas dimensões e formas de controle, propagados nas rotinas de atendimento, nos critérios de elegibilidade, no modo de organização do cotidiano institucional e nos padrões de comportamento veiculados, que demonstravam o caráter educativo e disciplinador do fazer profissional ( CESAR, 2010).

Nesse rastro, como resposta à crise de acumulação capitalista, encerrando-se como estratégia de reorganização da produção e dos mercados, o processo de reestruturação produtiva foi trazendo impactos importantes no mercado de trabalho do assistente social, tanto no setor público quanto no privado. No setor público, o processo foi de ampliação de postos de trabalho em decorrência da descentralização dos serviços sociais públicos. Já no âmbito das empresas industriais foi de alteração e/ou redução ( RAICHELIS, 2011), tanto pela não substituição de profissionais desligados, quanto na introdução de aspectos ligados à polivalência, “uma vez que o trabalho do assistente social é transferido para terceiros, na forma de consultoria” ( CESAR, 2010, p.135).

O processo de reestruturação industrial foi produzindo uma série de modificações nas estratégias de gestão cotidiana, que têm como fundamento a formação de um novo comportamento produtivo dos empregados, dando origem ao que Mota (2010) denomina de “negociação cooperativa”. Este processo negocial vai estabelecer a adoção de programas participativos que se pautam por princípios que regem a política de Recursos Humanos das empresas. Referem-se a preceitos que objetivam principalmente a “formação de metas e propósitos que expressem consenso entre empregados e empregadores, garantindo uma relativa coesão no processo de produção” ( MOTA, 2010, p.125).

O quadro de intensificação e precarização do trabalho, que foi afetando o conjunto dos trabalhadores das empresas, também vai atingir o Serviço Social. Esse cenário acarretou, em muitas situações, a reedição de demandas históricas dessa área nas empresas, assim como também gerou a definição de novos conteúdos para as práticas profissionais ( MOTA, 2010).

Ao mesmo tempo em que algumas das ações dos assistentes sociais vão ser redefinidas, estes profissionais estarão submetidos a injunções não apenas das novas formas sociais e técnicas sob as quais se organiza o processo produtivo e às novas necessidades específicas, mas também às modificações em suas próprias condições de trabalho.

O conjunto das novas exigências, para a prática do Serviço Social, relaciona-se com as transformações no processo de trabalho e em seus mecanismos de controle e organização, assim como na reprodução material da força de trabalho.

Assim, considerando o reconhecimento do trabalho integrativo do assistente social, a empresa o requisita para atuar na área de Recursos Humanos com vistas a atender as “necessidades humanas”, colaborando para a constituição da sociabilidade do trabalhador, de modo que este desenvolva comportamentos produtivos frente às cobranças das empresas.

mais do que humanizar a produção ou ajudar o trabalhador a enfrentar o ‘despotismo’ da fábrica, cabe ao Serviço Social colaborar pedagogicamente na socialização de valores e comportamentos, que desaguam na integração dos trabalhadores às novas exigências da produtividade ( MOTA, 2010, p. 124)

O Serviço Social, portanto, é reputado pela empresa como área que detém o instrumental e promove a adesão do trabalhador à nova lógica empreendida. E com isso refuncionaliza, sob o “pretexto” da inovação e da modernidade, demandas tradicionais que assumem uma aparência de novas, mas trata-se de um arcabouço sofisticado do que já existia. Essencialmente, o Serviço Social permanece sendo requisitado para intervir nas questões que interferem na produtividade, associados ao tratamento dos problemas de natureza psicossocial, que não se atrelam diretamente com o processo de trabalho, reiterando a representação histórica da natureza humanitária da profissão. Desse modo, desenvolve o papel de intermediador entre o campo do trabalho e a vida privada do trabalhador, ocupando um lugar de servir como “interlocutor da ação social” da empresa, sendo este sedimentado e integrado, progressivamente, às estratégias de competitividade assentadas na parceria entre trabalhador e empresa.

Paralelamente ao trabalho “educativo, orientador, moralizador e disciplinador” ( CESAR, 2010; MOTA, 2010) demandado pelo empresariado para assegurar os níveis de produtividade, enfraquecer conflitos, reprimir insubordinações, identificar insatisfações individuais e coletivas e tolher o potencial organizativo e reivindicatório dos trabalhadores, eleva-se o nível de elaboração das novas técnicas e discursos gerenciais que propagam a participação e a colaboração.

Concomitantemente à função tradicional do Serviço Social, de ter uma ação controladora sobre o dia a dia do trabalhador, infiltrando neste a racionalidade de um comportamento ajustado aos novos padrões de trabalho, somam-se a essa configuração as inflexões que as mudanças nas políticas de gerenciamento da força de trabalho engendram sobre a experiência dos assistentes sociais nas empresas.

Nesse rastro, é possível perceber a singularidade dos papéis que o Serviço Social exerce, destacando-se o assessoramento a aqueles que têm a função institucional de representar a empresa, ou seja, os gerentes. Nesse sentido, a interlocução do discurso gerencial, minimizando fontes de tensões e conflitos, são atribuições, frequentemente, agregadas ao clima ou ambiência organizacional e à transferência de informações para a gerência, colocando à disposição informações que respondam aos novos parâmetros da política de Recursos Humanos desenvolvidos pela empresa.

Apesar da lógica da horizontalidade do trabalho e das reestruturações implementadas, no que se refere à ação dos gerentes, o exercício do Serviço Social, nos anos de 1990, é transposto por uma nova racionalidade técnica e ideopolítica, na esfera da administração dos Recursos Humanos, que reapreende o tradicional em prol do moderno e miscigena velhas e novas demandas, impetrando aos profissionais estratégias que garantem sua legitimidade social.

Desenvolver um trabalho de caráter assistencial e educativo junto ao trabalhador e sua família, buscando responder às questões sociais dos mesmos que interferem na produtividade é uma demanda cotidiana dirigida ao Serviço Social. Dentre estas, estão as vinculadas ora às carências materiais, ora aos comportamentos “inadequados” ou “não produtivos” relacionados às condições de vida, ao relacionamento familiar, à disciplina fabril, à inadaptação ao trabalho, aos conflitos com os superiores, dentre outras.

Se anteriormente tais questões eram revestidas de cunho humanitário, essa roupagem foi se alterando, se assentando no moral do envolvimento e no equilíbrio de vantagens, quando esta relação é avaliada como imparcial e lucrativa para ambas as partes. Posteriormente, a intervenção do Serviço Social, se de um lado mantém uma abordagem com traços tradicionais de caráter pedagógico junto aos trabalhadores, foi se alterando no modo de socializar e utilizar as informações obtidas em sua atuação.

Portanto, nesse caminho, se particulariza a busca por outros espaços internos de intervenção que originalmente não eram ocupados pelos assistentes sociais, mas que exigem competências que também são identificadas na atuação dos assistentes sociais. Dentre estas se encontram as áreas de Planejamento, Recursos Humanos, Comunicação Empresarial Interna, Clima Organizacional em processos de diagnósticos e pesquisas, etc.

Ao mesmo tempo, observou-se que a lógica da multifuncionalidade e horizontalização traz uma série de controvérsias, uma vez que as respostas para as questões que envolvem propostas e soluções para as carências e conflitos, não mais são “próprias ou exclusivas” do Serviço Social, passando a ser uma competência de outros profissionais da área de Recursos Humanos e que, posteriormente e paulatinamente, serão incorporadas pelos gerentes.

Assim, a atribuição de assessoria é assumida pela área de Recursos Humanos ao conceber como “clientes internos” não somente os trabalhadores, mas principalmente o corpo gerencial. Para tanto, são criados e introduzidos instrumentos para apoiar os gerentes no alcance de metas junto às equipes, definindo formas de controle, que tendem a ser menos coercitivas e mais de caráter simbólico. O trabalho de assessoramento aos gerentes é direcionado no sentido de que possam melhor realizar o gerenciamento de suas equipes, propiciando maior “confiabilidade, amizade, aprendizado, crescimento e satisfação de seus colaboradores” ( MOTA, 2010, p.128).

Cesar (2010) considera que esta é uma questão central, pois situa

a problemática centralização/exclusão do Serviço Social na estrutura do controle administrativo, na medida em que a área de RH intensifica sua intervenção na vida cotidiana dos trabalhadores, (…) o assistente social pode ser deslocado ou recolocado no cerne desse gerenciamento ( CESAR, 2010, p. 176).

Desse modo, a competência do assistente social denota exigências no sentido de instrumentalizar as gerências no trato das carências e conflitos, colaborando com as mesmas no processo de integração dos empregados aos novos requisitos da produção e na “modernização das relações de trabalho”.

Na medida em que os gerentes de linha também são os responsáveis por algumas temáticas, que anteriormente estavam sob a responsabilidade da área de RH, considerando as questões que afetam o cotidiano das suas equipes, as demandas de intervenções técnicas que os auxiliem passam a existir, uma vez que estas requerem certo tipo de especialização e conhecimento que, inicialmente, apresentam-se muito distanciadas do seu domínio de formação. Ao assistente social, assim como também a outros profissionais da área de RH, foi atribuída a prescrição de assessoria aos gerentes, disponibilizando nessa prestação de serviços aos clientes internos (gerentes) o seu histórico know how. Este fato aponta para uma significativa mudança no exercício do Serviço Social, tanto nas empresas de um modo geral quanto na empresa em tela, ao passo que estas vão buscar, no fortalecimento da interação entre gerentes e trabalhadores, o reforço para a busca do consenso em torno dos objetivos corporativos.

Cesar (2010) e Mota (2010) entendem que esse fortalecimento pode resultar na eliminação gradual da intermediação do próprio assistente social. Entendem, ainda, que os gerentes, ao assumirem essa atribuição, vão criar condições para que o assistente social não possa materializar, na ação direta, o seu saber específico, e, ao mesmo tempo, poderão utilizar esse mesmo saber para legitimar o seu próprio papel gerencial.

Percebe-se, no entanto, uma maior requisição do assistente social por parte das gerências, na medida em que estas necessitam de uma intervenção técnica que os auxilie a administrar os conflitos. Além disso, evidencia também que a “multifuncionalidade”, que a empresa atribui e exige que os gerentes respondam à variedade de questões do dia a dia, não se configura suficiente, suscitando que o assistente social reafirme a “utilidade” de sua ação direta junto aos trabalhadores.

Nesse caminho, em função dessa nova configuração social e técnica do trabalho nas empresas, a valorização das áreas que administram e ressaltam a comunicação interna, a motivação no trabalho e a negociação de conflitos tornam-se espaços centrais de atuação de diferentes formações profissionais, inclusive como um espaço privilegiado de intervenção do assistente social. O assistente social passa a assumir a disseminação da cultura e dos valores, codificando e transmitindo mensagens, que subordinam sua ação ao repasse e à circulação de informações, dentro de um contexto de comunicação normalizada pelas empresas, com vistas ao reforço ou alteração de determinados padrões culturais e de comportamento.

As políticas de Recursos Humanos (RH) estão direcionadas para assentar as relações de trabalho na interdependência, na confiança mútua, no diálogo, na negociação, na convergência de interesses e na participação dos trabalhadores. Essas políticas são consubstanciadas nas sanções e contrapartidas oferecidas pela empresa, em prol do estabelecimento de um consenso, ou seja, em busca da construção de uma parceria empresarial, em torno dos resultados de produção e da identificação dos trabalhadores com os interesses empresariais. Nessa relação contraditória, vai ser atribuída ao assistente social a veiculação das normas e das “regras do jogo”, de modo que sua prática profissional permanece atravessada pelos conteúdos de controle revigorados nos processos e relações de trabalho.

A dimensão “pedagógica” da atuação do Serviço Social é uma marca historicamente determinada, que condiciona as requisições das empresas e consolida sua posição neste espaço sócio ocupacional. É via intervenção na reprodução material e “espiritual” da força de trabalho, por meio da prestação de serviços sociais e da orientação sobre um determinado modo de ser, sentir, pensar e agir, relativo ao trabalho, à sociedade e à vida ( FREIRE, 2003).

Os eixos de atuação do serviço social

O processo interventivo do Serviço Social, na área empresarial, perpassado pelas “velhas” e “novas” demandas, vai se expressar a partir de cinco eixos de atuação (AMARAL; CESAR, 2010, p.11), quais sejam: Treinamento e Desenvolvimento; Participativo; Qualidade de Vida; Clima ou Ambiência Organizacional e Responsabilidade Social Corporativa.

A inserção do assistente social em cada um destes eixos vai se explicitar de diferentes formas, mas todos reforçam o caráter adaptativo da função do profissional. No primeiro eixo, Treinamento e Desenvolvimento, o profissional contribui para a concepção de um processo educativo, com vistas a adequar os padrões de desempenho à flexibilização da produção e favorecer a adesão do trabalhador as metas empresariais.

Desse modo, as principais temáticas desdobradas estão afetas ao desenvolvimento de equipes, cooperação intergrupal, relacionamento interpessoal, entre outros. Do mesmo modo que outros profissionais, os assistentes sociais também são submetidos a esses mesmos treinamentos, tanto técnicos como os denominados “comportamentais”.

A atuação dos assistentes sociais no segundo eixo, Programas Participativos, tem como fundamento a cultura da qualidade, com vistas a estimular o envolvimento e comprometimento dos trabalhadores com a empresa. Desse modo, são implementadas ações com esta finalidade, de modo a adequar ideias e visões que reiterem a função pedagógica da intervenção profissional.

Nesse rastro, também seguem os Programas de Qualidade de Vida, relativos ao terceiro eixo, que têm a finalidade de ajustar e moldar os comportamentos dos trabalhadores aos novos métodos de produção. Estas são iniciativas que, em consonância com os processos de reprodução da força de trabalho, procuram enquadrar hábitos e cuidados com a saúde, alimentação, lazer, etc., via serviços sociais e ações socioeducativas. Implica, portanto, uma ação normativa que interfere sobre a vida dos trabalhadores dentro e fora da empresa.

No quarto eixo encontram-se os Programas referentes ao Clima ou Ambiência Organizacional. Estes vão utilizar como base pesquisas quantitativas, em sua maioria, sobre os indicadores organizacionais que identifiquem questões e temas que possam gerar satisfação dos trabalhadores com o trabalho, abrangendo aspectos pertinentes às políticas e projetos de Recursos Humanos e ao gerenciamento cotidiano junto aos processos e às relações de trabalho. A concepção de ambiência se refere a um conjunto mensurável de aspectos do ambiente de trabalho que interferem na motivação e desempenho dos trabalhadores, considerando a percepção que os mesmos têm sobre a empresa, quer seja sobre a organização, os processos e as relações de trabalho.

E no último eixo estão as ações sociais denominadas de “Responsabilidade Social Corporativa”, onde o Serviço Social atua no atendimento às demandas em relação à assistência social, alimentação, saúde, educação, preservação do meio ambiente, dentre outras, tanto para os trabalhadores quanto para as comunidades onde a empresa está inserida.

Nessa perspectiva, o Serviço Social, a fim de reafirmar-se na esfera empresarial, considerando sua inserção nas equipes multidisciplinares, obriga-se a requalificar-se, adequando-se a um perfil sociotécnico e político exigido e que extrapole o seu campo de conhecimentos, para abranger exigências que podem ser caracterizadas como “habilidades e qualidades pessoais” ( IAMAMOTO, 2003). Dentre estas, podem ser mencionadas algumas, tais como: “criatividade, desembaraço, versatilidade, iniciativa e liderança, capacidade de negociação e apresentação em público, fluência verbal, habilidade no relacionamento e capacidade de sintonizar-se com as rápidas mudanças no mundo dos negócios” ( IAMAMOTO, 2003, p.130).

Além destes eixos, ressaltam-se também ações voltadas para a avaliação da performance individual, considerando as exigências de um novo perfil profissional, associada aos atributos “comportamentais”, em todas as categorias profissionais, incluindo os assistentes sociais. Assim, no sentido de ampliar o conhecimento, de forma a atender às diretrizes de requalificação dentro de parâmetros das teorias sistêmicas e organizacionais, as empresas estruturam programas de treinamento e desenvolvimento com essa finalidade, uma vez que são introduzidos referenciais de padrões de eficácia e eficiência no plano de qualificação dos profissionais, a fim de otimizar a relação entre objetivos e meios e a maximização entre custos e objetivos. Esse viés busca, por meio de um agregado técnico-instrumental, conferir maior eficiência e dinamismo aos profissionais na elaboração de respostas de aplicabilidade direta para uma ampla variedade de questões a serem sanadas.

Geralmente, existe tanto por parte da empresa quanto pelos próprios profissionais uma maior valorização pelos cursos de curta duração, que almejam ter um aproveitamento prático e imediato sobre a realidade em relação a outros que buscam aprofundar alguma temática. Cria-se, portanto, a expectativa de que o profissional irá transformar sua prática cotidiana logo após a realização dessa modalidade de treinamento.

Até os anos 1990, fruto da política de esvaziamento e do processo de privatização implementado nessa década, o Serviço Social, assim como outras tantas categorias profissionais, detinha em seus quadros apenas profissionais próprios, concursados, via processos seletivos públicos. Nos anos 2000, esse cenário se alterou significativamente, marcado principalmente pelos processos de terceirização que foram intensificados. Tal condição de vínculo de trabalho posiciona esses trabalhadores como uma subcategoria, uma vez que não têm acesso aos mesmos benefícios, plano de cargos e salários, plano de carreira, plano de saúde, à política de desenvolvimento profissional, etc., como os demais trabalhadores próprios. Acrescenta-se, ainda, a presença permanente do “fantasma” de uma possível demissão ( CESAR, 2010, p. 136).

Pesquisa conduzida por Araújo (2010) constatou que na empresa, campo deste artigo, 55% dos profissionais de Serviço Social tinham como prioridade em sua intervenção cotidiana o atendimento social individualizado aos trabalhadores, aposentados e familiares, e as questões relativas à vida privada que estivessem interferindo na produtividade.

Um segundo foco de atuação, para 29% dos assistentes sociais, eram os Programas Sociais, onde se destacavam: Programa de Prevenção e Recuperação da Dependência Química, inaugurado no início da década de 1980; Programa de Preparo para Aposentadoria e Programa de Atualização para a Vida e o Trabalho, que foram implantados no começo da década de 1990; e outros desenvolvidos em períodos mais recentes, como o Programa de Assistência ao Empregado e o Programa de Resgate do Potencial Laborativo, mas que, sob o nosso ponto de vista, eram iniciativas já implementadas, mas com denominações mais condizentes com a linguagem empresarial vigente à época.

Essa é uma condição que reforça a necessidade de adequações e reconfigurações da intervenção profissional, como estratégia para manutenção de programas que visam atender às questões demandadas pelos trabalhadores. Sistematicamente, o que vem se identificando, ao longo da história nesse campo empresarial, são exigências imprescindíveis de alteração da linguagem, sofisticação e adoção de uma nova roupagem, com o objetivo de sugerir “algo novo”, uma vez que as demandas, tanto propostas pelo Serviço Social quanto pela empresa, não são unidirecionais, mas permeadas por interesses contraditórios. A depender do caráter que se imprima a essas ações, pode se limitar sua ênfase apenas ao disciplinamento do trabalhador ou optar por outro caminho que suscite e estimule a explicitação de espaços de debate e crítica sobre o cotidiano de trabalho.

Um terceiro foco interventivo, identificado por Araújo (2010), era a concentração para 40% dos assistentes sociais de uma atuação do Serviço Social voltada para o assessoramento aos gerentes em questões relativas à gestão de pessoas. Esse processo de assessoria correspondia à realização de diagnósticos sobre a qualidade das relações de trabalho na equipe de trabalhadores, por meio da análise dos dados de uma pesquisa interna sobre o clima organizacional, bem como de observações dos assistentes sociais a partir de contatos junto às equipes de trabalho; e ao desenvolvimento de ações de integração, de troca de conhecimentos, dentre outras temáticas identificadas que fossem pertinentes àquele universo organizacional.

E um último foco de intervenção, apontado por 26% dos profissionais ( ARAÚJO, 2010), se referia ao processo técnico e operativo que envolvia a aplicação anual de uma pesquisa corporativa de clima organizacional, onde o Serviço Social analisava os dados, apresentava os resultados para os gerentes e equipes e, contribuía na construção dos planos a serem sistematizados a partir do diagnóstico elaborado.

Por esse ângulo, torna-se fundamental desenvolver estratégias que certifiquem para a empresa que a intervenção do Serviço Social promove desdobramentos vantajosos não somente para os trabalhadores, mas também para a mesma enquanto contratante. Esse enfrentamento, a depender do universo empresarial, uma vez que o Serviço Social está submetido às condições das políticas empresariais decorrentes das injunções que atravessam os processos produtivos e as reestruturações, incluindo sua história, organização interna, lutas e articulação com os diversos atores nos diferentes níveis hierárquicos, se apresentará nesse embate de uma forma mais sutil ou acirrada. Acrescentam-se, a esse contexto interno, as políticas que trazem redução dos postos de trabalho; introdução da polivalência e racionalização de tarefas; terceirização de determinadas áreas, por serem consideradas não agregadoras de valor à área-fim da empresa, onde também o Serviço Social pode ser incluído; redução de padrões salariais; ampliação de contratos temporários, entre outros.

Toda essa dinâmica engendra impactos significativos no exercício profissional, quer seja na polivalência, na multifuncionalidade, na adaptabilidade às transformações em curso, sem perder a essencialidade do projeto profissional e o exercício de múltiplas competências. Essas são competências que estão relacionadas, primeiramente, ao processo formativo, ou seja, conhecimento teórico-metodológico, técnico-operativo; conjuntural e cultural da realidade empresarial e, análise e capacidade de articulação política. E também desenvolver uma atuação estratégica, identificando espaços e oportunidades de intervenção, trabalhar em equipes diversas, ter iniciativa e facilidade de comunicação e interlocução com diferentes atores, dentre outras ( ARAÚJO, 2010).

Nesse rastro, ratificamos a conclusão de Araújo (2010) de que “a qualificação profissional apreendida nos processos formativos acadêmicos não é suficiente para o exercício das atividades cotidianas (…)”. Essa também é uma constatação apontada por Souza e Azeredo (2003, p.10), uma vez que as exigências dirigidas ao assistente social, assim como de qualquer outro trabalhador, não se restringem “somente à qualificação adquirida na formação (teórica, metodológica e técnica), mas a algo que está para além, talvez ligado às capacidades múltiplas que emergem de uma situação particular de trabalho”.

Nesse terreno empresarial, é demandado ao assistente social inovar e recriar “sua caixa de ferramentas” teórico-metodológicas e seu arsenal de estratégias e respostas profissionais, que atendam à diversidade dos fenômenos sociais presentes no cotidiano da prática profissional. O assistente social também deve ser capaz de explicitar essas competências em seu exercício cotidiano, na metodologia de trabalho construída e nos resultados alcançados. Esta construção materializa-se na relação com os sujeitos envolvidos, demarcando sua posição nessa realidade de trabalho.

O trabalho do assistente social pode produzir resultados concretos nas condições materiais, sociais e culturais de vida de seus usuários, em seu acesso e usufruto de políticas sociais, programas, serviços, recursos e bens, em seus comportamentos, valores, seu modo de viver e de pensar, suas formas de luta e organização, suas práticas de resistência ( YAZBECK, 2002, p. 180).

Cabe destacar, ainda, que as competências teórico-metodológicas, ético-políticas e técnico-operativas são imprescindíveis e complementares entre si. No entanto, Iamamoto (2003) alerta para que estas dimensões não estejam aprisionadas em si mesmas, pois podem se transformar em limites que vêm forjando o cenário de determinadas dificuldades identificadas pela categoria profissional, que carecem de ser superadas: “o teoricismo, o militantismo e o tecnicismo”.

A falta de sistematização teórico-metodológica e a consequente intervenção inconsistente vêm abrindo espaço para propostas extremamente equivocadas para os profissionais das Ciências Humanas na área empresarial, dentre estes o assistente social.

É importante notar que, apesar de as empresas cobrarem do Serviço Social uma “organicidade” em relação aos seus objetivos, a experiência cotidiana permeada de contradições sociais institui condições para a expansão de alternativas críticas que possam ir ao encontro das demandas dos trabalhadores. Desse modo, novas possibilidades de trabalho podem se apresentar e necessitam ser decifradas e recriadas, pois se os assistentes sociais não o fizerem, outras categorias profissionais poderão ir, paulatinamente, absorvendo espaços ocupacionais até então reservados ao Serviço Social.

Considerações finais

O Serviço Social, inserido na divisão social e técnica do trabalho, está extremamente conectado à teia de transformações históricas advindas dos macroprocessos sociais, o que se reflete nos seus espaços de atuação profissional, os quais têm sofrido inflexões significativas. Sendo assim, enquanto profissional assalariado, a sua inserção no mercado de trabalho está perpassada pelos condicionantes econômicos, políticos e sociais previamente determinados.

Em uma sociedade como a brasileira, duramente atravessada pelas mais diferentes desigualdades, vão coexistir formas arcaicas e modernas de trabalho, espaços em que convivem terceirizados, subcontratados e empregados formais. Observam-se importantes e significativos avanços nas vanguardas acadêmicas, na interlocução com outras diversas áreas, no processo de sistematização e na qualidade da produção de conhecimento. Ao mesmo tempo, elevam-se as exigências de novas competências teórico-metodológicas, técnicas e políticas, de respostas qualificadas às demandas postas, na medida em que vai se requerer análises das diversas dimensões que perpassam a área das ciências humanas. Associam-se, nesse universo empresarial, uma força de trabalho superespecializada que gere processos técnicos complexos de alta tecnologia, e outros profissionais que só necessitam de conhecimentos elementares e básicos e que estão expostos, muitas vezes, a condições semelhantes ou muito diferenciadas de trabalho.

Simultaneamente, vão permanecer as tradicionais e novas demandas, requisitando do assistente social, consequentemente, mais conhecimento teórico-metodológico e eficácia operativa, pelos esquemas de controle e aferição de desempenho mais estritos. Acrescenta-se, ainda, a esta heterogeneidade, requisitos ligados à capacidade de organização e de identificação de alternativas de resistência que se tornam cada vez mais fluidas ou até mesmo inexistentes e o próprio desemprego, sob a justificativa de redução dos custos de produção.

Diante desse cenário, o desafio permanente para o Serviço Social é, sem negar a sua própria condição de trabalhador assalariado, legitimar que existe “espaço para a defesa do projeto profissional em qualquer local, público ou privado, em que o assistente social é requisitado a intervir” ( COUTO, 2009, p. 652).

E no campo da interdisciplinaridade e das interfaces entre as várias áreas do conhecimento não se pode perder de vista as dimensões investigativa e interpretativa como princípios norteadores, que vão possibilitar a compreensão dos problemas e da realidade a serem enfrentados pelos profissionais.

Para tanto, o aprimoramento intelectual se posiciona como valor básico nessa estratégia de afirmação profissional. Torna-se obrigatória a ênfase na formação acadêmico-científica qualificada, com suporte teórico-metodológico consistente, que possibilite a análise concreta da realidade e a formulação colaborativa de propostas com vistas à garantia dos direitos civis, sociais e políticos dos usuários, que são coprodutores deste processo e que, ao fazerem uso deste Serviço Social, neste mesmo movimento, nele acionam mudanças.

Quais as possibilidades de intervenção do assistente social no Serviço Social Organizacional?

É desse modo que o assistente social intervém na reprodução material e espiritual da força de trabalho, por meio da prestação de serviços sociais e da orientação sobre um determinado modo de ser, sentir, pensar e agir, em relação ao trabalho, à sociedade e à vida (cf. FREIRE, 2003).

Quais os principais instrumentos de intervenção profissional do assistente social?

São instrumentos diretos:.
Entrevista. ... .
Visita. ... .
Acolhimento Social. ... .
Acompanhamento Social. ... .
Atendimento Social. ... .
Trabalho em Grupo. ... .
Dinâmicas de Grupo. ... .
Reunião..

Qual é o objetivo da intervenção do profissional assistente social enquanto profissional inserido na divisão sociotécnica do trabalho?

Analisar os espaços sócio ocupacionais do assistente social exige inscrever a reflexão no movimento histórico da sociedade brasileira e mundial, considerando os processos sociopolíticos que condicionam o modo como o Serviço Social se insere na sociedade capitalista madura, como um tipo de especialização do trabalho ...

Como se expressam as ações relacionadas à intervenção interdisciplinar na prática profissional dos as assistentes sociais?

5. Como se expressam as ações relacionadas à intervenção interdisciplinar na prática profissional dos/as assistentes sociais? R. Sem ferir a especificidade das profissões e tampouco seus campos de especialidade.