Que conquistas as comunidades quilombolas conseguiram com a Constituição de 1988?

No imaginário popular é muito comum a associação dos quilombos a algo restrito ao passado, que teria desaparecido do país com o fim da escravidão. Mas a verdade é que as chamadas comunidades remanescentes de quilombos existem em praticamente todos os estados brasileiros. Levantamento da Fundação Cultural Palmares, do Ministério da Cultura, mapeou 3.524 dessas comunidades. De acordo com outras fontes, o número total de comunidades remanescentes de quilombos pode chegar a cinco mil.

Foto: Antônio Cruz/ABr

Que conquistas as comunidades quilombolas conseguiram com a Constituição de 1988?

Quilombolas no lançamento da Agenda Social Quilombola e do
Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial,
no Palácio do Planalto em Brasília, 2004

Tradicionalmente, os quilombos eram das regiões de grande concentração de escravos, afastados dos centros urbanos e em locais de difícil acesso. Embrenhados nas matas, selvas ou montanhas, esses núcleos se transformaram em aldeias, dedicando-se à economia de subsistência e às vezes ao comércio, alguns tendo mesmo prosperado. No entanto, devido justamente ao seu isolamento, existe uma grande dificuldade em se obter informações precisas e tornar amplo o conhecimento da população sobre as comunidades remanescentes de quilombos. Esse isolamento fazia parte de uma estratégia que garantiu a sobrevivência de grupos organizados com tradições e relações territoriais próprias, formando, em suas especificidades, uma identidade étnica e cultural que deve ser respeitada e preservada.

O mais emblemático dos quilombos formados no período colonial foi o Quilombo dos Palmares, que localizava-se na serra da Barriga, região hoje pertencente ao estado de Alagoas. Palmares resistiu por mais de um século, e o seu mito transformou-se em moderno símbolo brasileiro da resistência do africano à escravatura.

Conquistas

No período de redemocratização do Brasil, o Movimento Negro e lideranças das comunidades remanescentes de quilombos intensificaram a busca por direitos de cidadania. Envolvidos no processo de elaboração da Constituição Federal de 1988, asseguraram o direito à preservação de sua cultura e identidade, bem como o direito à titulação das terras ocupadas por gerações e gerações de homens e mulheres, que se contrapuseram ao regime escravocrata e constituíram um novo modelo de sociedade e de relação social.

Atualidade

Ao longo dessas duas últimas décadas, as conquistas das comunidades remanescentes de quilombos expandiram-se também para o cenário internacional. A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário, assegura aos grupos e comunidades tradicionais o direito de se autodefinirem. Em 20 de novembro 2003, o decreto 4.887 regulamentou o procedimento de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos quilombolas.

Em março de 2004 o Governo Federal criou o programa Brasil Quilombola, como uma política de Estado para essas comunidades, abrangendo um conjunto de ações integradas entre diversos órgãos governamentais. O direito à terra e ao desenvolvimento econômico e social passaram a ser reais e assumidos como prioridade governamental. Todas estas ações são coordenadas pela SEPPIR, por meio da Subsecretaria de Políticas para Comunidades Tradicionais.

Entre as mudanças constatadas desde então, estão os efeitos positivos da infra-estrutura e instalação de equipamentos sociais das comunidades; desenvolvimento econômico e social, com vistas à sustentabilidade ambiental, social, cultural, econômica e política dos quilombolas; e fomento ao controle e à participação social dos representantes quilombolas em diferentes esferas de proposição e formulação de políticas públicas.

A garantia do acesso à terra, relacionada à identidade étnica como condição essencial para a preservação dessas comunidades, tornou-se uma forma de compensar a injustiça histórica cometida contra a população negra no Brasil, aliando dignidade social à preservação do patrimônio material e imaterial brasileiro. Alterar as condições de vida nas comunidades remanescentes de quilombos por meio da regularização da posse da terra, do estímulo ao desenvolvimento sustentável e o apoio as suas associações representativas são objetivos estratégicos.

Foi a partir da mobilização das entidades ligadas ao movimento negro, que na Constituição de 1988, através do artigo 68 do capítulo dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, reconheceu, pela primeira vez, o direito das comunidades quilombo

Publicado 20/11/2007 15:32 | Editado 04/03/2020 16:43

Por Janice Muniz*


Só em maio de 2003, formou-se o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), sob a coordenação da Seppir e da Casa Civil, reunindo mais 12 órgãos ligados à área. O objetivo do grupo era propor políticas públicas de desenvolvimento social para as comunidades quilombolas.


Em novembro do mesmo ano, foi publicado o Decreto 4.887, de 20 novembro de 2003, editado pelo Governo Lula, que criou um mecanismo para o reconhecimento e titulação definitiva das comunidades quilombolas e os instrumentos jurídicos para a garantia do direito à terra. Também contribuiu para avanços importantes como, por exemplo, a auto definição das comunidades. Isto é, a caracterização das comunidades quilombolas será atestada mediante auto definição – é a própria comunidade que define, atestado através de um laudo antropológico.


O Decreto 4.887/2003, regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por comunidades quilombolas. Com o novo ordenamento, o conceito de quilombo foi ressignificado, sendo entendido a partir de então enquanto patrimônio material e imaterial, conquistado e mantido através de gerações de quilombolas, e enquanto símbolo de identidade e resistência negra.


O mesmo Decreto restituiu a execução da regularização fundiária dos territórios quilombolas ao INCRA e possibilitou a desapropriação de áreas particulares. Ele prevê também a formulação de políticas públicas que levem em consideração as características culturais e étnicas dos quilombolas.


Além destes, também outro instrumento importante é a Convenção 169 – da Organização Internacional do trabalho (OIT), que garante e assegura o cumprimento das leis em nível internacional.


*Janice Muniz é Procuradora Federal e membro do Comitê Estadual do PCdoB-ES.



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O que a Constituição brasileira de 1988 concedeu aos quilombolas?

A Constituição Brasileira de 1988, no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), consagra às comunidades de quilombolas o direito à propriedade de suas terras.

Quais são os direitos dos quilombolas conforme a Constituição Federativa do Brasil de 1998?

Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: "Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos".

Quais são os direitos dos quilombolas no Brasil?

BRASIL. Decreto nº 4.887 de 20 de novembro de 2003. Regulamenta o processo de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Porque a Constituição garantiu as comunidades quilombolas a posse das terras que ocupavam Brainly?

68 do ADCT garantiu às comunidades quilombolas o direito às terras por eles ocupadas mais àquelas necessárias ao desenvolvimento físico e cultural do grupo étnico-racial.