Tratamento diferenciado para micro e pequenas empresas em licitações

As micro e pequenas empresas possuem um papel fundamental para o desenvolvimento econômico e social do Brasil, já que respondem por mais de 25% do PIB e mais de 50% dos empregos com carteira assinada. A importância desse segmento é tal que mereceu um olhar especial do legislador constitucional, ao instituir a obrigação da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios em dispensar tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei (art.179,CF).

No que tange às compras públicas, a Lei n.º 8666/93 nada previu em relação a tratamento diferenciado às micro e pequenas empresas.

Somente em 2006, em decorrência do mandamento constitucional, com o advento da Lei Complementar n.º 123 foi instituído o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte e criado o Simples Nacional, estabelecendo as normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte.

A LC n.º 123, estabeleceu o tratamento diferenciado em diversos aspectos, inclusive no âmbito da participação das pequenas empresas nas licitações, em especial quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos.

É fato que o poder de compra do Estado como indutor do desenvolvimento no Brasil é essencial, especialmente para as pequenas empresas. Nesse sentido, no dia 1º de abril de 2021 foi publicada a tão aguardada nova Lei de Licitações – Lei n.º 14.133, trazendo uma série de avanços e alterações em relação às compras públicas, inclusive no tema de tratamento favorecido para as pequenas empresas.

A nova Lei de Licitações, no seu art. 4º, expressamente acolheu os art. 42 a 49 da LC n.º 123, que estabelece, dentro do capítulo de acesso a mercado, as disciplinas do tema de aquisições públicas. Em breve síntese, tais disposições se referem a prazo adicional para comprovação da regularidade fiscal e trabalhista no momento da habilitação em procedimentos licitatórios; preferência de contratação em caso de empate de propostas, realização de licitações exclusivas para micro e pequenas empresas; cota de 25% do objeto licitado destinado às micro e pequenas empresas e prioridade na contratação de micro e pequenas empresas locais ou regionais.

A nova lei também inovou ao trazer a possibilidade de pagamento às micro e pequenas empresas, agricultor familiar, produtor rural pessoa física, microempreendedor individual e sociedade cooperativa sem observância da ordem cronológica da obrigação, desde que previamente justificado e comunicado aos órgãos de controle e desde que demonstrado o risco de descontinuidade do cumprimento do objeto do contrato.

Por outro lado, a nova Lei de Licitações, trouxe também limitações aos benefícios às micro e pequenas empresas, ao disciplinar que as disposições acolhidas dos arts. 42 a 49 da LC n.º 123 não se aplicam nas seguintes hipóteses: (I) No caso de licitação para aquisição de bens ou contratação de serviços em geral, ao item cujo valor estimado for superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte; (II) No caso de contratação de obras e serviços de engenharia, às licitações cujo valor estimado for superior à receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte; (III) A obtenção de benefícios fica limitada às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte, devendo o órgão ou entidade exigir do licitante declaração de observância desse limite na licitação; (IV) Nas contratações com prazo de vigência superior a um ano, será considerado o valor anual do contrato na aplicação dos limites previstos acima descritos.

Por fim, tendo em vista que o poder de compra do Estado constitui sem dúvida alguma uma mola propulsora do desenvolvimento econômico e social do Brasil, temos que questionar quais serão os impactos e as consequências para as pequenas empresas dessas limitações.

Nesse sentido, tem havido posições que defendem como benéficas essas limitações, como em contraposição, severas críticas, que consideram as limitações como duro golpe às pequenas empresas. Como trata-se de uma legislação recente, somente o tempo dirá qual das posições contrapostas defendidas de fato prevalecerá.Torcemos para que sejam de fato benéficas!

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Em que consiste na prática o tratamento privilegiado dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte?

O tratamento diferenciado concedido às ME e EPP visou incentivar o desenvolvimento econômico, com foco na distribuição de renda, na ampliação da arrecadação estatal e principalmente na geração de empregos, pois, a norma jurídica é utilizada justamente com o intuito de fomentar a criação de empresas dessa natureza, como ...

Qual é o fundamento constitucional para o tratamento favorecido para empresas de pequeno porte?

A ordem econômica da Constituição foi explícita ao definir como princípio o “tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país”.

Qual é o tratamento diferenciado conferido a essas modalidades de atividade empresária?

A Lei nº 9.317/96, conhecida como a Lei do Simples trouxe o tratamento diferenciado, favorecido e simplificado as ME e EPP em relação aos impostos e contribuições, reduzindo a carga tributária e simplificando a forma de recolhimento dos tributos federais.

O que é um tratamento diferenciado?

A Constituição Federal prevê tratamento privilegiado para as empresas que se encaixam nessas categorias. A diferenciação se baseia no princípio da isonomia: tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida das suas desigualdades.